Os apelados arguem prejudicial de prescrição sob o argumento de que "considerando a data em que firmado o contrato de desconto (05/JAN/2007) como o título que embasa esta ação, quanto que considerando os cheques, tem-se que os mesmos possuem mais de 5 anos da data da distribuição da ação (24/MARÇO/2016)" (f. 248 doc único).
Dispõe o art. 206, §5º, I do Código de Processo Civil:
Art. 206. Prescreve:
(...)
§ 5º Em cinco anos:
I - a pretensão de cobrança de dívidas líquidas constantes de instrumento público ou particular;
(...).
O art. 6º caput e seu §4º, da Lei nº 11.105/05, dispõem:
Art. 6º A decretação da falência ou o deferimento do processamento da recuperação judicial suspende o curso da prescrição e de todas as ações e execuções em face do devedor, inclusive aquelas dos credores particulares do sócio solidário.
[...]
§4º Na recuperação judicial, a suspensão de que trata o caput deste artigo em hipótese nenhuma excederá o prazo improrrogável de 180 (cento e oitenta) dias contado do deferimento do processamento da recuperação, restabelecendo-se, após o decurso do prazo, o direito dos credores de iniciar ou continuar suas ações e execuções, independentemente de pronunciamento judicial.
Já o art. 59 da Lei nº 11.105/05 estabelece que "o plano de recuperação judicial implica novação dos créditos anteriores ao pedido, e obriga o devedor e todos os credores a ele sujeitos, sem prejuízo das garantias, observado o disposto no § 1o do art. 50 desta Lei".
No caso dos autos, a decretação da recuperação judicial dos apelados, com a novação dos créditos anteriores ao pedido, se deu em 10/04/2013 (ff. 127/132 doc único). A ação de cobrança foi ajuizada em 24/03/2016. Portanto, não há que se falar em prescrição.
Como bem pontuou a Mma. Juíza de Direito na decisão saneadora, "a recuperação judicial da empresa executada restou decretada em 10/04/2013, com novação dos créditos anteriores ao pedido, nos termos do art. 59 Lei 11.101/2006. Nesta trilha, com a novação decretada pela recuperação judicial, entendo que não restou expirado o quinquídio legal de que trata o art. 206, §5º, I, do CC/02" (f. 181 doc único).
Íntegra do acórdão:
APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO DE COBRANÇA - CONTRATO DE DESCONTO DE TÍTULOS - PRESCRIÇÃO - NÃO PAGAMENTO DOS TÍTULOS DESCONTADOS - ÔNUS DA PROVA. 1. Com a decretação da recuperação judicial do devedor, ocorrendo novação dos créditos anteriores ao deferimento do pedido de recuperação judicial, não há que se falar em prescrição. 2. "O descontário, para receber a quantidade de numerário pretendida, transmite o título representativo do crédito de que é credor, mas não fica definitivamente desvinculado da operação. Obriga-se a reembolsar o valor nominal do título, mais despesas decorrentes, na hipótese de mostrar-se inadimplente o devedor originário no pagamento da dívida, quando do seu vencimento".
APELAÇÃO CÍVEL Nº 1.0000.18.078977-8/001 - COMARCA DE POÇOS DE CALDAS - APELANTE(S): BANCO BRADESCO S/A - APELADO(A)(S): CASTELLANI ALIMENTOS LTDA, JULIO CESAR CARVALHO DE BONIS, MYRIAM CHRISTINA MIRANDA DE BONIS
A C Ó R D Ã O
Vistos etc., acorda, em Turma, a 12ª CÂMARA CÍVEL do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, na conformidade da ata dos julgamentos, em NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO.
DES. JOSÉ FLÁVIO DE ALMEIDA
RELATOR.
DES. JOSÉ FLÁVIO DE ALMEIDA (RELATOR)
V O T O
BANCO BRADESCO S/A apela da sentença (ff. 226/228 doc único) destes autos de ação de cobrança ajuizada em desfavor de CASTELLANI ALIMENTOS LTDA., JÚLIO CÉSAR CARVALHO DE BONIS e MYRIAM CHRISTINA MIRANDA DE BONIS, que julgou improcedente o pedido, nos termos do arr. 487, I do Código de Processo Civil, condenando-o ao pagamento das custas processuais e de honorários advocatícios de 10% do valor da causa.
O apelante alega que "a ação foi devidamente instruída com os documentos comprobatórios da operação (acordo comercial de desconto de títulos de crédito, cópias dos cheques descontados, extratos de movimentação da conta corrente e demonstrativos do débito), permitindo a exata compreensão da lide e da responsabilidade dos Apelados pelo pagamento. A empresa Apelada, ao contestar a ação, declarou expressamente que o crédito objeto desta ação já havia sido declarado no procedimento de recuperação judicial"; que "não resta dúvida de que o arrolamento do crédito naquele procedimento demonstrou que a devedora reconhece a dívida e se propõe a pagá-la, o que não impede, no entanto, que o Banco busque a recuperação do crédito junto aos garantidores, por meio da presente ação de cobrança"; que havendo "expresso reconhecimento do débito de responsabilidade da empresa Apelada (tanto que esta relacionou o crédito do Apelante no procedimento de recuperação judicial), não se mostra razoável exigir que o Banco comprove o crédito perseguido" (f. 240 doc único). Prossegue afirmando que restou "comprovada a existência e liquidez do débito, o qual foi reconhecido pela devedora, não sendo o caso de exigir-se outras comprovações pelo credor" (f. 241 doc único). Pede o provimento do recurso para reformar a sentença e julgar procedente o pedido inicial (ff. 238/241 doc único).
Preparo pago (ff. 242/243 doc único).
Os apelados arguem prejudicial de mérito de prescrição sob o argumento de que "tanto em se considerando a data em que firmado o contrato de desconto (05/JAN/2007) como o título que embasa esta ação, quanto que considerando os cheques, tem-se que os mesmos possuem mais de 5 anos da data da distribuição da ação (24/MARÇO/2016). Ainda que refutada tal alegação quando do despacho saneador, por ser matéria de ordem pública, pode novamente ser revista por esta Instância ad quem, o que se requer".
Alegam que "o Banco teve diversas oportunidades de fazer a prova do inadimplemento dos cheques, sendo que sequer acostou os borderôs para comprovar, como defendido, o quantum foi creditado na conta da empresa Apelada, viabilizando que esta se defendesse" (ff. 248/249 doc único). Questionam os encargos incidentes sobre o débito. Assevera que não há como aferir os encargos cobrados "se o Banco Apelante não acostou documentos considerados essenciais para o procedimento de cobrança buscado" (f. 249 doc único). Pedem o desprovimento do recurso e a manutenção da sentença (ff. 247/250 doc único).
Conheço da apelação, porque estão presentes os pressupostos de admissibilidade.
Prescrição
Os apelados arguem prejudicial de prescrição sob o argumento de que "considerando a data em que firmado o contrato de desconto (05/JAN/2007) como o título que embasa esta ação, quanto que considerando os cheques, tem-se que os mesmos possuem mais de 5 anos da data da distribuição da ação (24/MARÇO/2016)" (f. 248 doc único).
Dispõe o art. 206, § 5º, I do Código de Processo Civil:
Art. 206. Prescreve:
(...)
§ 5º Em cinco anos:
I - a pretensão de cobrança de dívidas líquidas constantes de instrumento público ou particular;
(...).
O art. 6º caput e seu § 4º, da Lei nº 11.105/05, dispõem:
Art. 6º A decretação da falência ou o deferimento do processamento da recuperação judicial suspende o curso da prescrição e de todas as ações e execuções em face do devedor, inclusive aquelas dos credores particulares do sócio solidário.
[...]
§ 4º Na recuperação judicial, a suspensão de que trata o caput deste artigo em hipótese nenhuma excederá o prazo improrrogável de 180 (cento e oitenta) dias contado do deferimento do processamento da recuperação, restabelecendo-se, após o decurso do prazo, o direito dos credores de iniciar ou continuar suas ações e execuções, independentemente de pronunciamento judicial.
Já o art. 59 da Lei nº 11.105/05 estabelece que "o plano de recuperação judicial implica novação dos créditos anteriores ao pedido, e obriga o devedor e todos os credores a ele sujeitos, sem prejuízo das garantias, observado o disposto no § 1o do art. 50 desta Lei".
No caso dos autos, a decretação da recuperação judicial dos apelados, com a novação dos créditos anteriores ao pedido, se deu em 10/04/2013 (ff. 127/132 doc único). A ação de cobrança foi ajuizada em 24/03/2016. Portanto, não há que se falar em prescrição.
Como bem pontuou a Mma. Juíza de Direito na decisão saneadora, "a recuperação judicial da empresa executada restou decretada em 10/04/2013, com novação dos créditos anteriores ao pedido, nos termos do art. 59 Lei 11.101/2006. Nesta trilha, com a novação decretada pela recuperação judicial, entendo que não restou expirado o quinquídio legal de que trata o art. 206, § 5º, I, do CC/02" (f. 181 doc único).
Assim, rejeito a prejudicial de prescrição.
Mérito
O apelante ajuizou ação ordinária para cobrar dos apelados R$ 62.014,19 referentes ao saldo devedor de "Acordo Comercial para Desconto de Títulos de Crédito" (ff. 12/14 doc único).
Em contestação os apelados arguem preliminar de mérito de prescrição, preliminar de incompetência relativa e de inépcia da petição inicial por falta de documento indispensável "que é o borderô" (f. 111 doc único).
A Mma. Juíza de Direito julgou improcedente o pedido com os seguintes fundamentos:
[...] Conforme destacado na decisão anterior, na cobrança de "Contrato de Desconto de Títulos de Crédito", além do demonstrativo do débito, compete a parte autora instruir o pedido com os títulos não - pagos, bem como prova de diligências no recebimento do crédito cedido. [...] Na realidade, nesse ponto reside a diferença fundamental entre o mútuo e o desconto: enquanto naquele, salvo garantia solidária, o mutuário é o principal devedor, no desconto, a cessão do crédito, pro solvendo, do descontário ao banco cria para este o direito e, ao mesmo tempo, o dever de diligenciar a cobrança do título junto ao devedor cedido, antes de voltar-se contra o cedente. Assim, apenas no caso de inadimplemento do terceiro, pode o banco se voltar contra aquele que lhe transferiu o título, desde que o título esteja vencido e que o débito não tenha sido pago pelo terceiro, sacado. Portanto, para se comprovar o inadimplemento do sacado, que figura na relação como terceiro, o protesto do título cedido ou a dupla apresentação dos cheques a compensação com permanência do nome do terceiro nos cadastros de restrição ao crédito ou, ainda, comprovar estar na posse dos títulos, poderiam comprovar o requisito essencial, para procedência do presente pedido. [...] Observa-se dos autos que, apesar de alertado sobre seu encargo, o requerente não se desincumbiu do ônus de provar o inadimplemento do terceiro emitente do título que lhe foram repassados. Destaco que o pedido de quebra do sigilo bancário de terceiro, resta totalmente ilegal e impertinente, uma vez que, pela natureza do contrato, incumbe a autora promover a guarda dos títulos de créditos descontados ou recibos de resgate dos mesmos para comprovar seu direito a restituição. [...] Ante o exposto, julgo improcedente o pedido, extinguindo o feito, com julgamento do mérito, nos termos do art. 487, I, do CPC. Condeno o autor no pagamento das custas, despesas processuais e honorários advocatícios que arbitro em 10% sobre o valor atualizado da causa (ff. 226/228 doc único).
Data venia, as razões de apelação e os elementos de convicção produzidos nos autos não infirmam os fundamentos e a conclusão da sentença.
Os documentos que instruem a ação de cobrança não têm força probatória para demonstrar a inadimplência dos apelados.
É que, como bem pontuou a d. Sentenciante, em contrato de desconto de título de crédito, "a cessão do crédito, pro solvendo, do descontário ao banco cria para este o direito e, ao mesmo tempo, o dever de diligenciar a cobrança do título junto ao devedor cedido, antes de voltar-se contra o cedente. Assim, apenas no caso de inadimplemento do terceiro, pode o banco se voltar contra aquele que lhe transferiu o título, desde que o título esteja vencido e que o débito não tenha sido pago pelo terceiro, sacado".
Arnaldo Rizzardo pontifica:
O descontário, para receber a quantidade de numerário pretendida, transmite o título representativo do crédito de que é credor, mas não fica definitivamente desvinculado da operação. Obriga-se a reembolsar o valor nominal do título, mais despesas decorrentes, na hipótese de mostrar-se inadimplente o devedor originário no pagamento da dívida, quando do seu vencimento. (Contratos de Crédito Bancário, 5ª ed. São Paulo: Ed. Revistas dos Tribunais, 2000. p. 92).
No caso dos autos, os documentos demonstram apenas que os apelados transferiram títulos de terceiros que estavam em seu poder para o banco apelante, mas não comprovam a inadimplência dos devedores originários e responsáveis pelo pagamento do débito no vencimento dos títulos, que poderia ser feita por meio do protesto do título, apresentação dos cheques à compensação ou até com a posse dos originais dos títulos.
Deve ser ressaltado que a Mma. Juíza oportunizou ao apelante a prova do inadimplemento do terceiro emitente dos títulos ao determinar sua intimação "para apresentar na Secretaria do Juízo os cheques originais, bem como cópias destes nos autos, comprovando a devolução dos mesmos por ausência de fundos e ausência de resgate pelo emitente, no prazo razoável de trinta dias, sob pena de improcedência do pedido" (f. 186 doc único).
Contudo, o apelante se manifestou informando apenas que "não possui os cheques originais que foram devolvidos por inexistência de fundos, haja vista que, os títulos dados em garantia foram emitidos por uma 3ª (Terceira) pessoa FABIOLA SILVA KRETU DOCES - ME CNPJ: 10.374.099/0001-45, [...] para a confirmação da ausência de fundos dos cheques além das cópias juntadas nos autos é necessário a expedição de ofício, autorizando ao Banco Requerente acesso a conta e aos extratos para comprovar a ausência de fundos dos títulos emitidos pela 3ª (Terceira) pessoa" (f. 195 doc único).
Assim, o apelante não se desincumbiu do ônus de provar o inadimplemento do terceiro emitente dos títulos.
A propósito, em caso análogo, no julgamento da apelação número 1.0518.08.160651-0/001, acórdão desta 12ª Câmara Cível, da relatoria do eminente Desembargador Domingos Coelho, decidimos:
AÇÃO MONITÓRIA - CONTRATO DE DESCONTO BANCÁRIO, DESACOMPANHADO DE QUALQUER ELEMENTO QUE COMPROVA O NÃO PAGAMENTO DE TÍTULOS POR TERCEIROS - AUSÊNCIA DE TÍTULO INJUNCIONAL. O contrato de desconto bancário, em tese, pode perfeitamente instruir ação monitória manejada em face do descontário, quando demonstrada a origem da dívida e comprovado o inadimplemento por parte dos terceiros emitentes dos títulos transferidos; Hipótese, entretanto, na qual o descontante não fez qualquer prova acerca da origem da dívida e do não pagamento dos títulos de crédito que recebeu, ônus esse que lhe competia. (TJMG - Apelação Cível 1.0518.08.160651-0/001, Relator(a): Des.(a) Domingos Coelho, 12ª CÂMARA CÍVEL, publicação da súmula em 21/03/2011).
Logo, renovada vênia, a sentença recorrida da lavra da douta Juíza de Direito, Dra. Alessandra Bittencourt dos Santos Deppner, deve ser confirmada.
Diante do exposto, com fundamento no art. 93, IX da Constituição da República e art. 371 do Código de Processo Civil, rejeito a preliminar e nego provimento à apelação.
Condeno o apelante ao pagamento das custas recursais e majoro os honorários advocatícios para 15% do valor da causa (§ 11 do art. 85 do Código de Processo Civil).
DES. JOSÉ AUGUSTO LOURENÇO DOS SANTOS - De acordo com o(a) Relator(a).
DESA. JULIANA CAMPOS HORTA - De acordo com o(a) Relator(a).
SÚMULA: "NEGARAM PROVIMENTO À APELAÇÃO."