A inovação na ordem jurídica trazida pela Lei nº 11.101/05 estabeleceu como 'vacatio legis' o período de 120 (cento e vinte) dias após a sua publicação (art. 201), ou seja, publicada em 09.02.2005 a sua eficácia somente se daria após 09.06.2005, hipótese em que não seria aplicada aos processos de falência ou de concordata ajuizados anteriormente ao início de sua vigência, que deveriam ser concluídos nos termos do Decreto-lei n. 7.661/45 (art. 192).
Abaixo, a íntegra do acórdão:
Acórdão: Apelação Cível n. 1.0024.06.023747-6/002, de Belo Horizonte.
Relator: Des. Edilson Fernandes.
Data da decisão: 20.05.2008.
Número do processo: 1.0024.06.023747-6/002(1)
Relator: EDILSON FERNANDES
Relator do Acordão: EDILSON FERNANDES
Data do Julgamento: 20/05/2008
Data da Publicação: 01/07/2008
EMENTA: FALÊNCIA - HABILITAÇÃO DE CRÉDITO DIRIGIDA PERANTE O PODER JUDICIÁRIO - LEI Nº 11.101/05 - ADMISSIBILIDADE. Inexiste óbice legal a que o pedido de habilitação de crédito em falência seja postulado diretamente ao Poder Judiciário, mesmo havendo norma legal dispondo que o pedido deve ser feito ao administrador judicial (art. 7º., § 2º., Lei nº 11.101/05), uma vez verificada a ausência de prejuízos aos litigantes/interessados, aliado ao fato de que, nos casos de credores retardatários, é admitida a impugnação judicialmente.
APELAÇÃO CÍVEL N° 1.0024.06.023747-6/002 - COMARCA DE BELO HORIZONTE - APELANTE(S): MINISTÉRIO PÚBLICO ESTADO MINAS GERAIS - APELADO(A)(S): BRASIL TRANSP INTERMODAL LTDA - RELATOR: EXMO. SR. DES. EDILSON FERNANDES
ACÓRDÃO
Vistos etc., acorda, em Turma, a 6ª CÂMARA CÍVEL do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, incorporando neste o relatório de fls., na conformidade da ata dos julgamentos e das notas taquigráficas, à unanimidade de votos, EM NEGAR PROVIMENTO.
Belo Horizonte, 20 de maio de 2008.
DES. EDILSON FERNANDES - Relator
NOTAS TAQUIGRÁFICAS
O SR. DES. EDILSON FERNANDES:
VOTO
Trata-se de recurso interposto contra a r. sentença de f. 100/105, proferida nos autos da Habilitação de Crédito apresentada por BRASIL TRANSPORTES INTERMODAL LTDA. contra a MASSA FALIDA DE VANAZ URBANIZAÇÃO E CONSTRUÇÕES LTDA., que julgou procedente o pedido para determinar seja incluído no quadro geral de credores o crédito de R$ 123,53, na classe de credor quirografário, a ser atualizado monetariamente.
Em suas razões, sustenta o Ministério Público que a falida teve a sua quebra decreta em 23.11.2005, sob a vigência da nova lei de falência (Lei nº 11.101/05), que estabelece novas regras acerca da habilitação de crédito, não podendo, por isso, aplicar ao caso concreto o teor do Decreto nº 7.661/45, expressamente revogado pela lei vigente (art. 192). Afirma que a nova ordem legal estabelece que a verificação dos créditos deve ser examinada pelo administrador e não pelo Judiciário, hipótese que, se convencendo dos argumentos e documentos juntados pelo credor, publica edital contendo a nova relação de credores; caso o administrador não inclua o crédito ou faça a classificação diversa daquela que o credor entende de direito, é que surge a possibilidade de atuação judicial. Requer a reforma do julgado (f. 106/128).
Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso.
A controvérsia submetida à apreciação diz respeito ao procedimento adotado pelo credor em pleitear a habilitação do crédito diretamente ao Poder Judiciário e não através de pedido formulado perante o administrador judicial, nega vigência ao disposto no art. 7º., § 2º., da Lei nº 11.101/05.
Segundo consta dos autos Vanaz Urbanização e Construções Ltda., teve a sua quebra decretada em 23.11.2005 (f. 86), vindo a empresa Brasil Transportes Intermodal Ltda. propor em juízo pedido de habilitação de crédito em face da falida, representada por uma duplicata de prestação de prestação de serviço no valor de R$ 123,53, em 07.03.2007 (f. 86).
A inovação na ordem jurídica trazida pela Lei nº 11.101/05 estabeleceu como 'vacatio legis' o período de 120 (cento e vinte) dias após a sua publicação (art. 201), ou seja, publicada em 09.02.2005 a sua eficácia somente se daria após 09.06.2005, hipótese em que não seria aplicada aos processos de falência ou de concordata ajuizados anteriormente ao início de sua vigência, que deveriam ser concluídos nos termos do Decreto-lei nº 7.661/45 (art. 192).
No especial caso em exame, é inconteste que a regra a ser observada pela habilitanda é aquela prevista no art. 7º., § 2º., da Lei nº 11.101/05, que estabelece um procedimento administrativo nos seguintes termos:
"Art. 7º - A verificação dos créditos será realizada pelo administrador judicial, com base nos livros contábeis e documentos comerciais e fiscais do devedor e nos documentos que lhe forem apresentados pelos credores, podendo contar com o auxílio de profissionais ou empresas especializadas.
(...)
§ 2º O administrador judicial, com base nas informações e documentos colhidos na forma do caput e do § 1º. deste artigo, fará publicar edital contendo a relação de credores no prazo de 45 (quarenta e cinco) dias, contado do fim do prazo do § 1º. deste artigo, devendo indicar o local, o horário e o prazo comum em que as pessoas indicadas no art. 8º. desta Lei terão acesso aos documentos que fundamentaram a elaboração dessa relação.
Referida norma tem por objetivo possibilitar o controle da legitimidade do crédito habilitante e evitar possíveis abusos e fraudes perpetradas entre o falido e terceiro, em verdadeiro conluio, sempre com o escopo de prejudicar a massa e os demais credores legítimos.
Embora conste da lei de regência um procedimento extrajudicial na verificação e habilitação do crédito falimentar, nada obsta que o credor postule esse direito diretamente perante o Poder Judiciário que, em havendo plausibilidade da ameaça ao direito, é obrigado a efetivar o pedido de prestação jurisdicional requerido pelo interessado, visto que a indeclinabilidade da prestação judicial é princípio básico que rege a jurisdição.
Como se vê, o princípio da inafastabilidade da jurisdição previsto no art. 5º, XXXV, da Constituição Federal obsta qualquer cerceio ou restrição do exercício desse direito de ação, por parte do credor, no sentido de invocar a prestação da tutela jurisdicional com a finalidade de resguardar a satisfação de seu interesse.
De acordo com a jurisprudência majoritária e consoante a doutrina de vanguarda, vigora em nosso sistema processual o princípio da instrumentalidade das formas, devendo ser reputados válidos os atos que cumpram a sua finalidade essencial, sem que acarretem prejuízos aos litigantes/interessados.
Quando a lei prescrever determinada forma, sem cominação de nulidade, é lícito ao Magistrado considerar válido o ato se, realizado de outro modo, lhe alcançar a finalidade.
Ao serem intimadas da pretensão deduzida em juízo, tanto a sócia da falida (f. 88) quanto a administradora judicial (f. 88v), não se opuseram à presente habilitação.
A propósito, o inconformismo ministerial já foi objeto de análise por esta egrégia Câmara nos autos do processo nº 1.0024.06.021852-6/001, oportunidade em que participei como vogal, cujo resultado de julgamento restou assim ementado:
"HABILITAÇÃO DE CRÉDITO. VIA JUDICIAL. MINISTÉRIO PÚBLICO. EXTINÇÃO DO PROCESSO. Apesar de a Lei 11.101/05 estabelecer que o crédito deve ser apresentado ao administrador judicial para ser habilitado extrajudicialmente, não há prejuízo se for apresentado no juízo da falência e atendida pelo MM. Juiz competente" (Rel. Des. JOSÉ DOMINGUES FERREIRA ESTEVES, j. 09/10/2007).
Ademais, o art. 10, § 5º., c/c art. 13 da lei de regência estabelecem que as habilitações de crédito retardatárias, se apresentadas antes da homologação do quadro-geral de credores, serão recebidas sob a forma de impugnação a ser é dirigida ao Juiz por meio de petição, instruída com os documentos que tiver o impugnante, o qual indicará as provas consideradas necessárias.
Por último, em caso absolutamente idêntico ao que se examina, a egrégia Sétima Câmara Cível assim já decidiu:
"HABILITAÇÃO DE CRÉDITO FEITA, NÃO AO ADMINISTRADOR JUDICIAL, MAS DIRETAMENTE PERANTE O JUDICIÁRIO - LEI 11.101/05 - EXTINÇÃO DO PROCESSO SEM JULGAMENTO DE MÉRITO - IMPOSSIBILIDADE.
- O formalismo jurídico não se pode sobrepor a uma diretriz constitucional, sendo a Constituição expressa no sentido de que lei não pode excluir da apreciação do Judiciário lesão ou ameaça a direito. - O sistema instituído pela nova lei de falência não veda que a habilitação de crédito, em alguns casos, possa ser feita diretamente perante o Judiciário (arts. 10, par. 5º, e 13, da Lei 11.101, de 2005)" (Processo nº 1.0024.06.089209-8/001, Rel. Des. WANDER MAROTTA, j. 17/04/2007).
Forçoso concluir que inexiste óbice legal a que o pedido de habilitação de crédito em falência seja postulado diretamente ao Poder Judiciário, mesmo havendo norma legal dispondo que o pedido deve ser feito ao administrador judicial (art. 7º., § 2º., Lei nº 11.101/05), uma vez verificada a ausência de prejuízos aos litigantes/interessados, aliado ao fato de que, nos casos de credores retardatários, é admitida a impugnação judicialmente.
NEGO PROVIMENTO AO RECURSO.
Custas pelo apelante, isento na forma da lei.
Votaram de acordo com o(a) Relator(a) os Desembargador(es): MAURÍCIO BARROS e ANTÔNIO SÉRVULO.
SÚMULA : NEGARAM PROVIMENTO.