A decretação de indisponibilidade dos bens dos sócios falidos é medida acautelatória, assegurada pelos artigos 798 e 799 do CPC, bem como pelo artigo 82, §2º, da Lei 11.101/2005, que não enseja a perda da propriedade. Havendo indícios de fatos que podem ensejar a responsabilização solidária e ilimitada dos sócios, a medida acautelatória deve ser mantida.
Íntegra do acórdão:
Acórdão: Apelação Cível n. 70031636962, de Porto Alegre.
Relator: Des. Romeu Marques Ribeiro Filho.
Data da decisão: 22.06.2011.
EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL. EMBARGOS DE TERCEIRO. FALÊNCIA. INDISPONIBILIDADE DOS BENS DOS SÓCIOS. MEDIDA ACAUTELATÓRIA. POSSIBILIDADE. A decretação de indisponibilidade dos bens dos sócios falidos é medida acautelatória, assegurada pelos artigos 798 e 799 do CPC, bem como pelo artigo 82, §2º, da Lei 11.101/2005, que não enseja a perda da propriedade. Havendo indícios de fatos que podem ensejar a responsabilização solidária e ilimitada dos sócios, a medida acautelatória deve ser mantida. APELO DESPROVIDO.
APELAÇÃO CÍVEL
QUINTA CÂMARA CÍVEL
Nº 70031636962
COMARCA DE PORTO ALEGRE
FRANCISCO SQUEFF NORA - APELANTE
ROSANA NORA - APELANTE
MASSA FALIDA RPA -REGIAO PORTO ALEGRE ESTACIONAMENTOS LTDA - APELADO
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos os autos.
Acordam os Desembargadores integrantes da Quinta Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado, à unanimidade, em negar provimento ao apelo.
Custas na forma da lei.
Participaram do julgamento, além do signatário, os eminentes Senhores DES. JORGE LUIZ LOPES DO CANTO (PRESIDENTE) E DES.ª ISABEL DIAS ALMEIDA.
Porto Alegre, 22 de junho de 2011.
DES. ROMEU MARQUES RIBEIRO FILHO,
Relator.
RELATÓRIO
DES. ROMEU MARQUES RIBEIRO FILHO (RELATOR)
Trata-se de recurso de apelação interposto por FRANCISCO SQUEFF NORA E OUTRA contra sentença proferida nos autos dos embargos de terceiro opostos em desfavor de MASSA FALIDA RPA- REGIÃO PORTO ALEGRE ESTACIONAMENTOS LTDA, que julgou improcedente o pedido.
Em suas razões recursais (fls. 207/218), os apelantes referem que, em função de terem tido a decretação de indisponibilidade de seus bens particulares, nos autos do pedido de autofalência, tiveram que opor os embargos de terceiro, os quais foram julgados improcedentes. Aduzem que a indisponibilidade dos bens dos sócios deve ser determinada se houver em tramitação ação de responsabilização, o que não é o caso dos autos. Nega a existência de indícios de atividade lesiva dos sócios a justificar a constrição.
Sustentam que a indisponibilidade dos seus bens é ilícita, já que não foi praticado qualquer ato lesivo contra a sociedade, além do que o capital foi totalmente integralizado. Enfatizam a inexistência de débitos quirografários relevantes e de dívidas de empregados, esclarecendo que a dívida fiscal, apontada pela administradora judicial, decorre de débitos fiscais inadimplidos que geraram a adesão a parcelamentos impagáveis, o que não pode ser considerado como indício de fraude. Pugnam pelo provimento do recurso.
Intimada a contra-arrazoar o recurso, a apelada requer o seu desprovimento.
Sobreveio Parecer do Ministério Público (fls. 223/230), pelo desprovimento do apelo.
Houve a substituição do síndico e a ele foi oportunizado prazo para contrarrazões, as quais foram apresentadas às fls. 270/273.
Os autos foram encaminhados ao Ministério Público (fls. 276/277), ao ilustre Procurador de Justiça, Dr. Gilmar Maroneze, o qual reiterou o Parecer ofertado pelo seu colega, o igualmente ilustre Dr. Antônio Augusto Vergara Cerqueira.
Registro que foi observado o disposto nos artigos 549, 551 e 552, do CPC, tendo em vista a adoção do sistema informatizado.
É o relatório.
VOTOS
DES. ROMEU MARQUES RIBEIRO FILHO (RELATOR)
Presentes os pressupostos recursais, conheço do apelo.
Embora os relevantes fundamentos apresentados pelos apelantes, a sentença não comporta modificação.
Os apelantes, na condição de sócios da empresa falida, tiveram a decretação de indisponibilidade de seus bens particulares, quando da prolação da sentença falimentar.
Desde já, é preciso ser ressaltado que a indisponibilidade dos bens particulares é uma medida acautelatória que tem por objetivo o resguardo da prestação jurisdicional, estando prevista nos artigos 798 e 799 do Código de Processo Civil e, na Lei 11.101/2005, no artigo 82, §2º.
Acerca da indisponibilidade dos bens, ensina Fabio Ulhoa Coelho ensina:
"Cabe a indisponibilidade de bens quando houver fundado receio de frustração da execução da sentença condenatória que afinal vier a ser proferida responsabilizando o sócio, acionista ou administrador. Não existindo esse receio, não há razões para a medida extrema."
No caso em exame, há indícios, embora eles sejam contestados pelos apelantes, de que os diversos estacionamentos, indicados nos documentos de fls. 34/112, pertencem ao mesmo grupo da falida.
Além disto, todos os estacionamentos funcionam com o nome fantasia NPARK, sendo que alguns deles, inclusive, chegaram a funcionar no mesmo local, e de forma sucessiva, como exemplo, a RPA e a Servipark.
Como bem destacado pelo novo síndico, a massa falida suportou prejuízo substancial, entretanto, ainda assim, seus sócios adquiriram patrimônio razoável, o que é, no mínimo, suspeito, necessitando uma averiguação.
A situação fática da empresa falida, bem como de seus sócios, ora apelantes, foi brilhantemente retratada no Parecer do ilustre Antônio Augusto Cerqueira, o qual adoto parcialmente, a fim de evitar tautologia:
"(...) Outrossim, corroborando o entendimento acima transcrito, verifica-se que, no caso em tela, conforme documentos de fls. 34/112, há diversos estacionamentos que parecem pertencer ao mesmo grupo da falida, uma vez que o primeiro embargante figura como sócio, e que todos recebem o nome fantasia de "N Park", onde somente o objeto da falência enfrentou problemas e veio a falir, e outros, têm movimento/faturamento bastante significativos (estacionamento do aeroporto, servipark).
Ademais, a empresa SERVIPARK, sócia minoritária da falida, continua em pleno funcionamento no mesmo ramo de negócio, no mesmo endereço da falido, o que, no mínimo merece ser sopesado.
Deste modo, repisa-se, vislumbra-se que o primeiro embargante, é sócio de outras empresas do mesmo ramo (em plena atividade), e o outro sócio minoritário - que também é empresa de estacionamento- funciona no mesmo endereço fornecido como da falida, e todas utilizam o mesmo nome fantasia.
Por conseguinte, há que se ter prudência, pois todos tais fatos, podem ensejar que a responsabilização solidária e ilimitada dos sócios, e se não se adotar medida de proteção do patrimônio - através da medida de indisponibilidade ora atacada - não se garantirá a efetivação da jurisdição, o ressarcimento aos credores da Massa Falida pelos prejuízos que tiveram.
Frisa-se, por oportuno, que o apelante, em suas razões, reiterou os argumentos anteriormente despendidos, não trazendo fundamento novo que ensejasse a alteração do entendimento já esposado no feito pelo Ministério Público e pelo juízo singular. (...)".
A jurisprudência também vem reconhecendo a manutenção da indisponibilidade em casos análogos:
AGRAVO DE INSTRUMENTO. FALÊNCIA. INDISPONIBILIDADE DOS BENS. SÓCIO ADMINISTRADOR DA FALIDA. INTELIGÊNCIA DOS ARTS. 82 E 99, INCISO VII, AMBOS DA LEI Nº 11.101/2005. DECISÃO MANTIDA. NEGARAM PROVIMENTO AO RECURSO. UNÃNIME. (Agravo de Instrumento Nº 70039418371, Sexta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Luís Augusto Coelho Braga, Julgado em 17/03/2011)
AGRAVO DE INSTRUMENTO. FALÊNCIA. RESTRIÇÃO JUDICIAL DE INDISPONIBILIDADE SOBRE BEM MÓVEL. POSSIBILIDADE JURÍDICA. 1.O Juiz pode determinar a restrição judicial de indisponibilidade sobre o bem móvel da agravante com base no artigo 99, inciso VI, da novel Lei de Falências e Recuperação de Empresas, visto que se trata do poder geral de cautela, a fim de garantir a isonomia de tratamento entre os credores. 2.O Administrador Judicial tem o direito, em tese, de propugnar pela declaração de ineficácia dos atos praticados pelo falido que resultem na alienação de bens em flagrante prejuízo à massa, bem como, pleitear responsabilização direta dos sócios por eventual ilícito praticado por estes, cuja reparação repercuta em proveito da massa subjetiva. 3. Releva ponderar, ainda, que não houve pedido certo de substituição de garantia, isto é, foi indicado o bem que seria adquirido com as devidas especificações, mais moderno, e, por óbvio, de valor maior, o que poderia ser comprovado mediante nota fiscal, sobre o qual iria recair a nova indisponibilidade, o que seria possível de examinar, sendo que o pleito formulado era apenas de levantamento da restrição, sem a cautela de informar veículo certo, cuja compra estaria sendo realizada para o fim determinado da modificação pleiteada. Negado seguimento ao agravo de instrumento. (Agravo de Instrumento Nº 70040365488, Quinta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Jorge Luiz Lopes do Canto, Julgado em 28/01/2011)
AGRAVO DE INSTRUMENTO. FALÊNCIA E CONCORDATA. PEDIDO DE LEVANTAMENTO DA INDISPONIBILIDADE INCIDENTE SOBRE IMÓVEL DE SÓCIO DE EMPRESA FALIDA INDEFERIDO. RESTRIÇÃO QUE NÃO SE CONFUNDE COM PENHORA. CONFIGURAÇÃO DO BEM DE FAMÍLIA QUE NÃO O RESGUARDA DA MERA INDISPONIBILIDADE. DECISÃO MANTIDA. AGRAVO DE ISNTRUMENTO DESPROVIDO EM DECISÃO MONOCRÁTICA DO RELATOR. (Agravo de Instrumento Nº 70032509580, Sexta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Antônio Corrêa Palmeiro da Fontoura, Julgado em 24/11/2009)
FALÊNCIA. EMBARGOS DE TERCEIRO. INDISPONIBILIDADE DE BENS. MANUTENÇÃO. O ato de decretação de indisponibilidade de bens, determinada pelo juízo da falência, que não implica afronta ao direito de propriedade. Uma vez não preenchidos os requisitos do art. 1.046 do CPC, não se mostra possível o acolhimento do pedido de liminar, consistente na desconstituição da restrição de indisponibilidade de imóveis, determinada pelo juízo da falência. AGRAVO DESPROVIDO. (Agravo de Instrumento Nº 70022914071, Quinta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Leo Lima, Julgado em 13/08/2008)
Como bem destacado pela juíza singular, a conclusão que se chega é que a medida de indisponibilidade anteriormente decretada deve permanecer em vigência uma vez que a discutida medida vem ao interesse da efetividade da jurisdição, a fim de evitar que a execução se frustre por inexistência de patrimônio caso venha a existir a existir responsabilidade por parte dos sócios.
Outrossim, cabe ser ressaltado que a indisponibilidade dos bens não importa em alteração da propriedade, logo, inexiste prejuízo aos apelantes com a manutenção da constrição.
ANTE O EXPOSTO, nego provimento ao apelo, mantendo integralmente a sentença.
DES.ª ISABEL DIAS ALMEIDA (REVISORA) - De acordo com o(a) Relator(a).
DES. JORGE LUIZ LOPES DO CANTO (PRESIDENTE) - De acordo com o(a) Relator(a).
DES. JORGE LUIZ LOPES DO CANTO - Presidente - Apelação Cível nº 70031636962, Comarca de Porto Alegre: "NEGARAM PROVIMENTO AO APELO. UNÂNIME."
Julgador(a) de 1º Grau: MARIA DE LOURDES G. BRACCINI DE GONZALEZ