Bruno Oliveira Castro Cristiano Imhof

LEI DE RECUPERAÇÃO DE EMPRESAS E FALÊNCIA INTERPRETADO

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TJPR. Natureza jurídica da recuperação judicial

Data: 29/09/2009

Consoante proveitosos escólios de Jorge Lobo (Comentários À Lei de Recuperação de Empresas e Falência coordenado por Paulo F. C. Salles de Toledo e Carlos Henrique Abrão, Saraiva, p. 105), "a recuperação judicial é um favor legal porque garante ao devedor, atendidos determinados pressupostos e requisitos, formais e materiais, o direito de sanear o estado de crise econômico-financeira em que se encontra com a finalidade de salvar o negócio, manter o emprego dos trabalhadores, respeitar os interesses dos credores (art. 47) e reabilitar-se (art. 63), benefício legal que produz efeitos desde o deferimento da petição inicial da ação de recuperação com a suspensão 'de todas as ações e execuções' pelo prazo de cento e oitenta dias (art. 6º, caput e §4º).

Abaixo, a íntegra do acórdão:

Acórdão: Agravo de Instrumento n. 370.646-3, de Pinhais.
Relator: Des. Lauri Caetano da Silva.
Data da decisão: 04.10.2006.

EMENTA: RECUPERAÇÃO JUDICIAL. AÇÃO DE REINTEGRAÇÃO DE POSSE. CONTRATO DE COMPRA E VENDA DE MAQUINÁRIO COM RESERVA DE DOMÍNIO. LIMINAR REVOGADA PELO JUÍZO A QUO ANTE A NOTÍCIA DE QUE A EMPRESA REQUERIDA SE ENCONTRA EM PROCESSO DE RECUPERAÇÃO JUDICIAL. DECISÃO QUE REVELA PRUDÊNCIA E BOM SENSO. INTERPRETAÇÃO SISTEMÁTICA DO ARTIGO 6º E RESPECTIVO § 4º, ARTIGOS 47 E 58 DA LEGISLAÇÃO DE REGÊNCIA (LEI 10.101/05). BENS, ADEMAIS, QUE SE MOSTRAM NECESSÁRIOS AO DESEMPENHO DA ATIVIDADE EMPRESARIAL DA RECUPERANDA. RECURSO DEPROVIDO. 1. De acordo com o artigo 6º da Lei 11.101/05, "a decretação da falência ou o deferimento do processamento da recuperação judicial suspende o curso da prescrição de todas as ações e execuções em face do devedor, inclusive aquelas dos credores particulares do sócio solidário". 2. Embora os titulares de créditos oriundos de contratos de venda com reserva de domínio não se sujeitem aos efeitos da recuperação judicial, prevalecendo em relação aos mesmos os direitos de propriedade sobre a coisa e as condições contratuais, não lhes será permitido "durante o prazo de suspensão a que se refere o § 4º do art. 6º da legislação específica, a venda ou a retirada do estabelecimento do devedor dos bens de capital essenciais a sua atividade empresarial" (art. 49, § 3º, da Lei 11.101/05). 3. Hipótese em que, pelas suas peculiaridades, deve ser entendido que o prazo de suspensão a que se refere o § 4º do artigo 6º conta-se da concessão da recuperação judicial, e não do seu processamento.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Agravo de Instrumento nº 370.646-3, do Foro Regional de Pinhais, em que é agravante Uteco Indústria e Comércio de Máquinas Limitada e agravada Stampafare Embalagens Ltda.

ACORDAM os Desembargadores integrantes da 17ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná, por unanimidade de votos, em negar provimento ao agravo.

I - RELATÓRIO

1. Trata-se de agravo de instrumento - com pedido de efeito suspensivo - regularmente interposto por Uteco Indústria e Comércio de Máquinas Limitada contra a decisão proferida pelo Juízo da Vara Cível do Foro Regional de Pinhais às f. 277 dos autos nº 1034/2006 de Ação de Reintegração de Posse (f. 11/18-TJ), ajuizada em face de Stampafare Embalagens Limitada, que revogou a liminar (f. 109) de apreensão e depósito de três máquinas objetos do contrato de compra e venda com reserva de domínio (f. 277), após examinar pedido de reconsideração (f. 118/135-TJ) baseado em pedido de recuperação judicial, homologação do respectivo plano aprovado em assembléia de credores, e concessão da recuperação, conforme sentença proferida em 12.05.2006 (f. 139-TJ).

Está da decisão agravada:

"Tendo em vista os relevantes fatos apresentados e comprovados pelo requerido, com base no art. 807 do CPC, revogo a medida liminar concedida às fls. 109, com isto evitando prejuízos irreversíveis à requerida, em recuperação judicial.
Autorizo desde já o envio através de fax-simile ao Juízo da Comarca de Jundiaí/SP de cópia desta decisão, com a determinação de suspensão dos atos de reintegração de posse.
Sobre a petição de fls. 111 e seguintes, diga o autor em 10 (dez) dias.
Oficie-se ao Juízo de Jundiaí/SP, solicitando informações sobre os autos mencionados às fls. 130 (1417/2005 - 4ª Vara Cível)...".

2. Inconformada, aduz a agravante que:

a) o contrato de compra e venda com reserva de domínio foi firmado em 11.07.2002, pelo preço de R$ 2.941.477,31, do qual foi parcelado a importância de R$ 687.356,49 em 33 prestações mensais de R$ 20.829,13, sendo que a primeira venceu em 09.10.2002;
b) a compradora Stampafare Embalagens Limitada paralisou os pagamentos na 16ª prestação;
c) a devedora foi notificada extrajudicialmente e devidamente constituída em mora via interpelação judicial;
d) quando do cumprimento da ordem de apreensão das máquinas ficou sabendo do pedido de recuperação judicial e o crédito reclamado não foi relacionado no processo;
e) a decisão agravada viola as regras dos artigos 526 e 527 do Código Civil e 1071 do Código de Processo Civil.

3. Por não vislumbrar, diante do contido às f. 130/132 dos autos (f. 137/139-TJ), a plausibilidade do direito invocado pela sociedade empresária agravante, deixou este Relator de conceder o efeito suspensivo pretendido.

II - VOTO

4. Cuida-se de agravo de instrumento interposto frente a decisão judicial proferida em ação de reintegração de posse que, diante da concessão de recuperação judicial à empresa requerida (ora agravada), houve por bem em revogar a liminar de apreensão e depósito de três máquinas objetos de contrato de compra e venda com reserva de domínio firmado com a autora (f. 118-TJ), evitando com isso prejuízos irreversíveis à recuperanda.

Analisando o contido nos autos, entendo que não merece reparos a decisão a quo.

Depreende-se das f. 137/139 que foi concedida à sociedade agravada Strampafare Embalagens Ltda (após a homologação do plano de recuperação judicial aprovado na assembléia de credores) a recuperação judicial, em consonância com o artigo 58 da Lei nº 11.101/05. Consoante proveitosos escólios de Jorge Lobo1, "a recuperação judicial é um favor legal porque garante ao devedor, atendidos determinados pressupostos e requisitos, formais e materiais, o direito de sanear o estado de crise econômico-financeira em que se encontra com a finalidade de salvar o negócio, manter o emprego dos trabalhadores, respeitar os interesses dos credores (art. 47) e reabilitar-se (art. 63), benefício legal que produz efeitos desde o deferimento da petição inicial da ação de recuperação com a suspensão 'de todas as ações e execuções' pelo prazo de cento e oitenta dias (art. 6º, caput e § 4º)" - grifo não original.
Com efeito, dispõe o artigo 6º da Lei 11.101/05 que "a decretação da falência ou o deferimento do processamento da recuperação judicial suspende o curso da prescrição de todas as ações e execuções em face do devedor, inclusive aquelas dos credores particulares do sócio solidário".
Estão sujeitos à recuperação judicial "todos os créditos existentes na data do pedido", à exceção das dívidas tributárias, das obrigações a título gratuito, das despesas realizadas para habilitação na recuperação, das quantias ilíquidas e dos créditos oriundos de contratos de alienação fiduciária, leasing, compra e venda ou promessa de compra e venda com cláusula de irrevogabilidade e irretratabilidade, reserva de domínio; e, adiantamento a contrato de câmbio para exportação.

Embora os titulares de créditos oriundos de contratos de venda com reserva de domínio não se sujeitem aos efeitos da recuperação judicial, prevalecendo em relação aos mesmos os direitos de propriedade sobre a coisa e as condições contratuais, não lhes será permitido "durante o prazo de suspensão a que se refere o § 4º do art. 6º da legislação específica, a venda ou a retirada do estabelecimento do devedor dos bens de capital essenciais a sua atividade empresarial" (art. 49, § 3º, da Lei 11.101/05).

A agravada é uma empresa atuante no mercado alimentício, farmacêutico, químico, de cosméticos, higiene pessoal e limpeza como convertora de embalagens flexíveis. A sua atividade empresarial consiste na "fabricação e comercialização de embalagens flexíveis laminadas ou outros produtos flexíveis" (tais como laminado para tampa de iogurte, blister para PVC, estruturas para refresco em pó, etc), para o que necessita de tecnologia para impressão em rotogravura, laminação, aplicação de parafina e "Hot Melt", metalização, gravação eletromecânica e aplicação de resinas, sendo crível, a princípio, a afirmativa de que necessita do maquinário adquirido da agravante2 para o desempenho da sua atividade empresarial (f. 119/129).

Assim e considerando que a agravada teve o seu plano de recuperação judicial homologado pelo Juízo e aprovado pela assembléia geral de credores, não me parece razoável permitir a agravante que retire do seu estabelecimento as máquinas objeto do contrato de compra e venda com reserva de domínio entre as mesmas firmado, sem ao menos possibilitar à agravada que dê início ao que se propôs no plano de recuperação. Tal afrontaria o próprio escopo do legislador ao imiscuir na Lei 10.101/05 o instituto da recuperação judicial. Pelo que, diante das peculiaridades da espécie, deve ser entendido que o prazo de suspensão a que se refere o § 4º do artigo 6º conta-se da concessão da recuperação judicial.

Ante o exposto, voto pelo desprovimento do presente recurso.

III- DECISÃO

ACORDAM os Desembargadores integrantes da 17ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná, por unanimidade de votos, em negar provimento ao agravo.

O julgamento foi presidido pelo Desembargador FERNANDO VIDAL DE OLIVEIRA, sem voto, e dele participaram os Desembargadores RENATO NAVES BARCELOS e VICENTE MISURELLI.

Curitiba, 04 de outubro de 2006.

DES. LAURI CAETANO DA SILVA
Relator

1 Comentários À Lei de Recuperação de Empresas e Falência coordenado por Paulo F.C. Salles de Toledo e Carlos Henrique Abrão, Sariva, p. 105.
2 Uma máquina resinadeira, uma máquina impressora rotogravura e uma máquina laminadora.

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