Assemelhando-se as disposições do artigo 161, §1º do Decreto-Lei nº 7.661/45 com as do artigo 52 da Lei nº 11.101/05, deve-se ter por irrecorrível o despacho que defere o pedido de processamento da recuperação judicial, dando marcha ao processo, sem especificamente envolver decisão sobre o problema jurídico instaurado nos autos, privilegiando-se assim a Súmula nº 264 do STJ.
Íntegra do acórdão:
Agravo de Instrumento n. 1.0024.09.640324-1/001, de Belo Horizonte.
Relator: Des. Teresa Cristina da Cunha Peixoto.
Data da decisão: 11.02.2010.
Número do processo: 1.0024.09.640324-1/001(1) Númeração Única: 6403241-85.2009.8.13.0024
Relator: TERESA CRISTINA DA CUNHA PEIXOTO
Relator do Acórdão: TERESA CRISTINA DA CUNHA PEIXOTO
Data do Julgamento: 11/02/2010
Data da Publicação: 01/06/2010
EMENTA: AGRAVO DE INSTRUMENTO - RECUPERAÇÃO JUDICIAL - DEFERIMENTO DO PEDIDO DE PROCESSAMENTO - DESPACHO IRRECORRÍVEL - RECURSO NÃO CONHECIDO. Assemelhando-se as disposições do artigo 161, §1º do Decreto-Lei nº 7.661/45 com as do artigo 52 da Lei nº 11.101/05, deve-se ter por irrecorrível o despacho que defere o pedido de processamento da recuperação judicial, dando marcha ao processo, sem especificamente envolver decisão sobre o problema jurídico instaurado nos autos, privilegiando-se assim a Súmula nº 264 do STJ.
AGRAVO DE INSTRUMENTO CÍVEL N° 1.0024.09.640324-1/001 - COMARCA DE BELO HORIZONTE - AGRAVANTE(S): BANCO BONSUCESSO S/A - AGRAVADO(A)(S): CONSTRUTORA PARCAN LTDA - RELATORA: EXMª. SRª. DESª. TERESA CRISTINA DA CUNHA PEIXOTO.
ACÓRDÃO
Vistos etc., acorda, em Turma, a 8ª CÂMARA CÍVEL do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, sob a Presidência do Desembargador EDGARD PENNA AMORIM , incorporando neste o relatório de fls., na conformidade da ata dos julgamentos e das notas taquigráficas, à unanimidade de votos, EM NÃO CONHECER DO RECURSO.
Belo Horizonte, 11 de fevereiro de 2010.
DESª. TERESA CRISTINA DA CUNHA PEIXOTO - Relatora
NOTAS TAQUIGRÁFICAS
Proferiu sustentação oral, pelo Agravante, o Dr. Otávio Vieira Barbi.
A SRª. DESª. TERESA CRISTINA DA CUNHA PEIXOTO:
Ouvi atentamente as palavras do Dr. Otávio Vieira Barbi, pelo Agravante.
Agradeço S. Ex.ª, que tocou fundo ao meu coração, a menção de alguns dos membros ilustres da minha família: Ministro Cunha Peixoto, meu tio; Euler, meu primo; Maurício da Cunha Peixoto, meu irmão, que são realmente grandes comercialistas e que, vez por outra, evidentemente, busco nas obras desses doutrinadores algumas questões que causam conflito aqui no Tribunal.
Trata-se de "Agravo de Instrumento, com pedido de Efeito Suspensivo" interposto pelo Banco Bonsucesso S/A contra a decisão de primeiro grau de fls. 403/404, que deferiu o processamento da recuperação judicial da Construtora Parcan Ltda., determinando certas providências.
Sustentou o recorrente, em síntese, que "não foram preenchidas as referidas condições, razão pela qual não lhe poderia ter sido deferido o processamento da recuperação judicial, sob pena de, assim sendo, prejudicar-se a coletividade de credores, cujos interesses devem ser tutelados na recuperação", aduzindo que não foram apresentadas "as demonstrações contábeis relativas ao ano de 2008", bem como "o relatório gerencial de fluxo de caixa e sua projeção".
Requereu a atribuição de efeito suspensivo ao recurso e, ao final, a reforma da decisão agravada, "indeferindo-se por completo o pedido de recuperação judicial da agravada".
Inicialmente, os autos foram distribuídos ao Desembargador Plantonista Mota e Silva, da 16ª Câmara Cível, que determinou a redistribuição, em vista da competência de uma das Câmaras da Unidade Goiás, tendo o Desembargador Ernane Fidélis, da 6ª Câmara Cível, entendido pela ausência da urgência a justificar a sua intervenção no plantão (fls. 667/672).
Cessado o plantão de final de semana/feriado, os autos foram redistribuídos a esta Desembargadora, tendo sido indeferido o pedido de efeito suspensivo às fls. 677/678.
Contraminuta apresentada às fls. 684/691.
Informações prestadas à fl. 693.
Manifestação da d. Procuradoria-Geral de Justiça (fls. 709/710), no sentido da desnecessidade de sua intervenção no feito, opinando, "a título colaborativo", pelo provimento do recurso.
Inicialmente, cumpre apreciar a preliminar suscitada em contraminuta de não conhecimento do recurso, ao argumento de ser irrecorrível a decisão que defere o processamento da recuperação judicial.
Nesse diapasão, estabelece o artigo 52 da Lei nº 11.101/05, que regula a recuperação judicial, a extrajudicial e a falência do empresário e da sociedade empresária, que "Estando em termos a documentação exigida no art. 51 desta Lei, o juiz deferirá o processamento da recuperação judicial e, no mesmo ato: (...)".
Por sua vez, dispõe o artigo 51 da Lei, in verbis:
"Art. 51. A petição inicial de recuperação judicial será instruída com:
I - a exposição das causas concretas da situação patrimonial do devedor e das razões da crise econômico-financeira;
II - as demonstrações contábeis relativas aos 3 (três) últimos exercícios sociais e as levantadas especialmente para instruir o pedido, confeccionadas com estrita observância da legislação societária aplicável e compostas obrigatoriamente de:
a) balanço patrimonial;
b) demonstração de resultados acumulados;
c) demonstração do resultado desde o último exercício social;
d) relatório gerencial de fluxo de caixa e de sua projeção;
III - a relação nominal completa dos credores, inclusive aqueles por obrigação de fazer ou de dar, com a indicação do endereço de cada um, a natureza, a classificação e o valor atualizado do crédito, discriminando sua origem, o regime dos respectivos vencimentos e a indicação dos registros contábeis de cada transação pendente;
IV - a relação integral dos empregados, em que constem as respectivas funções, salários, indenizações e outras parcelas a que têm direito, com o correspondente mês de competência, e a discriminação dos valores pendentes de pagamento;
V - certidão de regularidade do devedor no Registro Público de Empresas, o ato constitutivo atualizado e as atas de nomeação dos atuais administradores;
VI - a relação dos bens particulares dos sócios controladores e dos administradores do devedor;
VII - os extratos atualizados das contas bancárias do devedor e de suas eventuais aplicações financeiras de qualquer modalidade, inclusive em fundos de investimento ou em bolsas de valores, emitidos pelas respectivas instituições financeiras;
VIII - certidões dos cartórios de protestos situados na comarca do domicílio ou sede do devedor e naquelas onde possui filial;
IX - a relação, subscrita pelo devedor, de todas as ações judiciais em que este figure como parte, inclusive as de natureza trabalhista, com a estimativa dos respectivos valores demandados.
§1º Os documentos de escrituração contábil e demais relatórios auxiliares, na forma e no suporte previstos em lei, permanecerão à disposição do juízo, do administrador judicial e, mediante autorização judicial, de qualquer interessado.
§2º Com relação à exigência prevista no inciso II do caput deste artigo, as microempresas e empresas de pequeno porte poderão apresentar livros e escrituração contábil simplificados nos termos da legislação específica.
§3º O juiz poderá determinar o depósito em cartório dos documentos a que se referem os §§ 1o e 2o deste artigo ou de cópia destes".
A antiga Lei de Falências (Decreto-Lei nº 7.661/45), ao tratar da concordata, dispunha no §1º do artigo 161 que "estando em termos o pedido, o juiz determinará seja processado, proferindo despacho em que (...)", tendo o Superior Tribunal de Justiça, a esse respeito, editado a Súmula nº 264, segundo a qual "é irrecorrível o ato judicial que apenas manda processar a concordata preventiva".
No mesmo sentido, a seguinte decisão do Tribunal Superior:
"DIREITOS COMERCIAL E PROCESSUAL CIVIL. CONCORDATA PREVENTIVA. PRONUNCIAMENTO JUDICIAL QUE A MANDA PROCESSAR. IRRECORRIBILIDADE. HABILITAÇÃO DE CREDITO. CORREÇÃO MONETARIA. TERMO FINAL. ENUNCIADO N. 8 DA SUMULA/STJ. RECURSO PROVIDO. I- O ATO JUDICIAL QUE SIMPLESMENTE MANDA PROCESSAR A CONCORDATA E IRRECORRIVEL, UMA VEZ QUE NÃO RESOLVE NENHUMA QUESTÃO INCIDENTE. II- INCIDE CORREÇÃO MONETARIA NOS CREDITOS HABILITADOS EM CONCORDATA PREVENTIVA ATE O SEU EFETIVO PAGAMENTO, CONSOANTE ENUNCIADO N. 8 DA SUMULA/STJ" (REsp 115374/ES, Rel. Ministro SÁLVIO DE FIGUEIREDO TEIXEIRA, QUARTA TURMA, julgado em 12/05/1997, DJ 23/06/1997 p. 29141).
Em comentário ao artigo 52 da Nova de Lei de Falências, elucidam NELSON NERY JUNIOR e ROSA MARIA DE ANDRADE NERY:
"1. Legislação anterior: Correspondência parcial com a LF/1945 161 §1º. O STJ sumulou o entendimento de que, na concordata preventiva, o ato judicial que apenas determina o seu processamento é irrecorrível, por não decidir nenhuma questão incidente. O mesmo deve ocorrer com a decisão que defere o processamento da recuperação judicial, por se tratar de decisão da mesma natureza, e em razão dos princípios constitucionais da celeridade e economia processual, albergados pela LF 75 par. ún." (Código Civil Comentado e Legislação Extravagante, 3ª ed., São Paulo: Revista dos Tribunais, pág. 1161).
Importante colacionar, também, a lição de MOACYR LOBATO:
"A Lei n. 11.101, de 09 de fevereiro de 2005, estabeleceu dois momentos distintos quanto à apreciação, pelo juiz, do pedido de recuperação judicial formulado pelo devedor. O primeiro corresponde ao ato que defere o processamento da recuperação judicial, com a nomeação do administrador judicial e adoção de outras providências estabelecida no art. 52.
A outra etapa corresponde, efetivamente, à concessão da recuperação judicial pelo juiz, que está submetida à apreciação do plano pela assembléia geral de credores, que poderá, inclusive, propor alterações ao plano originalmente apresentado (art. 58). (...)
Deferir o processamento do pedido e conceder a recuperação judicial são atos exclusivamente judiciais, não obstante a concessão estar vinculada à manifestação assemblear dos credores. Diferentes os momentos, o conteúdo e os respectivos efeitos de cada ato judicial proferido no âmbito da recuperação judicial.
Não se pode olvidar que o legislação conferiu à recuperação judicial estrutura processual semelhante àquela atribuída pelo Dec.-lei n. 7.661/1945 à concordata, ao identificar e distinguir o processamento e concessão do pedido.
Com efeito, o art. 161 do revogado diploma falimentar priva a hipótese de deferimento do processamento do pedido em seu §1º, cuidando o art. 146 da sentença concessiva ou não da concordata pleiteada.
Sobre o tema, Rubens Requião, em ensinamento de todo pertinente às disposições da nova lei, asseverou:
É necessário desde já desfazer um sério equívoco que surge na compreensão dos mesmos efeitos ao trato do procedimento das concordatas. A muitos se afigura que, ao deferir a petição do devedor pleiteando o favor da concordata, foi ela desde logo concedida. Não é assim, porém. O despacho do juiz, que defere o pedido, sobretudo no caso de concordata preventiva, tem o efeito, apenas, de mandar processá-lo (...). Do despacho liminar do juiz, que recebe o pedido para mandar processá-lo, não há recurso algum.
O mesmo entendimento doutrinário foi chancelado pela jurisprudência pátria no sentido de que o ato judicial que mandava processar a concordata preventiva era efetivamente despacho, e, portanto, irrecorrível.
A hipótese prevista na legislação revogada quanto à irrecorribilidade do despacho guarda relação de profunda semelhança com o ato judicial que manda processar o pedido. A ausência de recurso para o ato na nova lei é, ainda, mais contundente, porque o devedor, na verdade, apresentará o plano de recuperação judicial em até 60 (sessenta) dias da publicação da decisão que houver deferido o processamento da recuperação judicial, sob pena de convolação em falência, conforme estabelece o art. 53, caput, da nova lei (Falência e Recuperação, Belo Horizonte: Del Rey, págs. 108/110).
Nesta senda, insurge-se o agravante contra a recuperação judicial, aduzindo que "o instituto (...) não pode ser desprestigiado a ponto de apenas servir para legitimar a inadimplência por parte de empresários inaptos à atividade" (fl. 09), entendendo que a "recuperação judicial é um instituto que tem finalidade jurídica e justa, qual seja, de preservar uma atividade empresarial viável. Mas tal viabilidade tem que ser fartamente demonstrada e comprovada" (fl. 12), tendo pleiteado o indeferimento do pedido de recuperação judicial (fl. 13).
Porém, consoante as lições supracitadas, o deferimento do processamento do pedido da recuperação distingui-se do deferimento da própria recuperação judicial, que se dá a posteriori, nos termos do artigo 53 e seguintes da Lei nº 11.101/05, após a apresentação do plano de recuperação pelo devedor, quando o julgador vai apreciar a sua devida viabilidade, sendo que contra a decisão que conceder a recuperação judicial caberá agravo (§2º do artigo 59), configurado, aí, o prejuízo do credor.
Não se deve perder de vista, por pertinente, o intuito da recuperação judicial, que é o de possibilitar a manutenção das atividades da empresa, privilegiando o interesse social e econômico na sua permanência, um dos motivos pelos quais o legislador foi parcimonioso ao cuidar dos recursos, trazendo poucos instrumentos recursais no curso do processo falimentar.
E, ainda que tenha havido, num primeiro momento, a instrução incompleta do pedido de processamento da recuperação judicial, como afirma o recorrente, com fulcro no artigo 51 da Lei nº 11.101/05, deixando o julgador de determinar a emenda da petição inicial, por considerar satisfeitos os pressupostos do processamento, aplicando, inclusive, os "princípios do hodierno Direito de empresa e concursal que primam pela manutenção do ente produtivo a bem dos interesses econômicos, financeiros, fiscais e, principalmente, sociais que provêm com a possibilidade de uma sobrevida à empresa que passa por momentânea dificuldade financeira" (informações de fl. 693), inviável a presente irresignação, que não é passível de alcançar o resultado prático almejado pela parte.
Deste modo, assemelhando-se as disposições do artigo 161, §1º do Decreto-Lei nº 7.661/45 com as do artigo 52 da Lei nº 11.101/05, de acordo com a doutrina majoritária sobre o tema, deve-se ter por irrecorrível o despacho que defere o pedido de processamento da recuperação judicial, dando marcha ao processo, sem especificamente envolver decisão sobre o problema jurídico instaurado nos autos, privilegiando-se com isso a Súmula nº 264 do STJ.
Destarte, e não obstante tenha na decisão de fls. 677/678 determinando o processamento do recurso, na modalidade de instrumento, necessário o acolhimento da preliminar suscitada pela agravada, para reconhecer a irrecorribilidade do despacho agravado e, consequentemente, não conhecer do recurso.
Com essas considerações, acolho a preliminar para não conhecer do recurso, ausentes os pressupostos de sua admissibilidade.
Custas recursais, pelo agravante.
O SR. DES. VIEIRA DE BRITO:
Sr.ª Presidente.
Também ouvi atentamente a sustentação oral produzida e cheguei à mesma conclusão contida voto de V. Ex.ª; razão pela qual a acompanho.
O SR. DES. BITENCOURT MARCONDES:
Sr.ª Presidente.
Em que pese a manifestação do ilustre Advogado sobre a questão de fundo, a questão levantada por V. Ex.ª diz respeito ao juízo de admissibilidade, motivo pelo qual acompanho-a e não conheço do recurso
SÚMULA : NÃO CONHECERAM DO RECURSO.
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE MINAS GERAIS
AGRAVO DE INSTRUMENTO CÍVEL Nº 1.0024.09.640324-1/001