Para decretação da falência com fundamento no art. 94, inc. II da Lei n. 11.101/2005, faz-se necessário que a empresa, devidamente citada na pessoa do representante legal, não tenha pago, depositado ou indicado bens em valor suficiente ao adimplemento da obrigação executada. Nesse sentido, Waldo Fazzio Júnior sustenta: "Nesse ponto, o que se leva em conta não é o inadimplemento de divida líquida e certa, mas o fato de, tendo ocorrido propositura de ação executiva, qualquer que seja, ou eficácia executiva imediata de alguma sentença, não ter o empresário executado pago, depositado a quantia reclamada ou nomeado bens à penhora. (...) Ajuizado pedido de falência, com arrimo no n. II do art. 94 da LRE, incumbe ao autor tão–somente comprovar que o devedor, citado para regular execução, não pagou nem depositou a quantia reclamada e tampouco nomeou bens à penhora" (FAZZIO JÚNIOR, Waldo. Nova lei de falência e recuperação de empresas. São Paulo: Atlas, 2005. p. 213).
Confira, abaixo, a íntegra do v. acórdão:
Acórdão: Apelação Cível n. 2006.01.1.026514-2, de Brasília.
Relator: Des. Sandra de Santis.
Data da decisão: 06.06.2007.
Órgão:Sexta Turma Cível
Classe:APC – APELAÇÃO CÍVEL
N. Processo:2006.01.1.026514-2
Apelante:HORUS TELECOMUNICAÇÕES LTDA.
Apelado(s):ARTE EQUIPAMENTOS ELETRÔNICOS LTDA.
Relatora Desª. : Sandra De Santis
Revisora Desª. : Ana Maria Duarte Amarante Brito
EMENTA: APELAÇÃO – PEDIDO DE FALÊNCIA – EXECUÇÃO FRUSTRADA – AUSÊNCIA DE REQUISITO ESSENCIAL - CITAÇÃO – PESSOA JURÍDICA – REPRESENTANTE PROCESSUAL. 1. Para decretação da falência com fundamento no art. 94, inciso II, da Lei 11.101/2005, faz-se necessário que a empresa, devidamente citada na pessoa do representante legal, não tenha pago, depositado ou indicado bens em valor suficiente ao adimplemento da obrigação executada. 2. O art. 12, VI, do CPC informa que a representação judicial das pessoas jurídicas é realizada por aqueles indicados nos estatutos e, em caso de omissão, pelos diretores. 3. Apelo improvido.
ACÓRDÃO
Acórdão os Senhores Desembargadores da Sexta Turma Cível do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios, SANDRA DE SANTIS – Relatora, ANA MARIA DUARTE AMARANTE BRITO – Revisora e JAIR SOARES – Vogal, sob a Presidência do Senhor Desembargador OTÁVIO AUGUSTO em NEGAR PROVIMENTO, UNÂNIME, de acordo com a ata do julgamento e notas taquigráficas.
Brasília, 06 de junho de 2007.
Desembargadora SANDRA DE SANTIS
Relatora
RELATÓRIO
Adoto, inicialmente, o relatório da sentença de fls. 101/103:
HORUS TELECOMUNICACOES LTDA, empresa qualificada nos autos, requereu perante este Juízo a falência de ARTE EQUIPAMENTOS ELETRONICOS, também já qualificada no processo, alegando ser credora da quantia de R$ 6.381,28 e que a devedora, citada em execução de título extrajudicial, não pagou, não depositou nem ofereceu bens à penhora.
Inicial acompanhada dos documentos de fls. 04/20.
Instada a emendar a inicial, para instruir os autos com certidão sucinta da ação executiva e ainda para esclarecer o pedido de citação da devedora em pessoa estranha ao quadro societário, a Requerente limitou-se a trazer a aludida certidão (fls. 25/26).
Considerando o insucesso das tentativas de citação da ré por mandados, foi determinada sua citação editalícia (fl. 46), tendo sido realizadas as publicações (fls. 48, 52/55), sem que a requerida apresentasse sua defesa (fl. 56).
A Curadoria Especial, nomeada à Ré, apresentou a contestação de fls. 62/67, requerendo a nulidade da citação editalícia. No mérito, impugnou os fatos narrados por negativa geral.
A Autora, em réplica, refutou as alegações da Ré e reiterou os termos da inicial (fls. 73/74).
As partes manifestaram desinteresse na produção de outras provas (fls. 81 e 85).
A autora, atendendo a determinação judicial trouxe aos autos certidão simplificada da ré (fl. 90/91) e esclareceu que FRANCISCO JOSÉ DE SOUZA, que recebeu a citação na ação de execução junto à 1ª Vara Cível, possuía procuração outorgando-lhe os poderes para tanto, sem entretanto apresentar qualquer documento comprobatório de sua alegação.
É o relatório.
O MM. Juiz extinguiu o processo sem julgamento de mérito, com fundamento no art. 267, inc. IV, do Código de Processo Civil, sob o argumento de que a autora não comprovou a citação regular da ré no processo de execução. Condenou-a ao pagamento de honorários advocatícios arbitrados em R$500,00 (quinhentos reais), com apoio no artigo 20, § 4º, do CPC.
Inconformada, apela a autora. Sustenta que não houve citação irregular no processo de execução. Aduz que se o Sr. Francisco José de Souza não tivesse poderes de representação da ré recusar-se-ia a receber a citação. Irresigna-se contra o valor arbitrado a título de honorários advocatícios.
Preparo à fl. 111.
Contra-razões às fls. 116/122.
Parecer da d. procuradoria de justiça às fls. 128/133, em que oficia pela improcedência do recurso.
É o relatório.
VOTOS
A Senhora Desembargadora SANDRA DE SANTIS – Relatora
Recurso tempestivo, cabível e regularmente processado. Dele conheço.
O Procurador de Justiça considerou desnecessária a declaração de nulidade do feito, aos seguintes argumentos:
Contudo, no presente caso, e só no presente caso, o Ministério Público entende ser desnecessária a argüição de nulidade do feito por falta de intervenção ministerial em primeiro grau de jurisdição, posto que a Requerente foi julgada carecedora de ação por ausência de pressuposto específico de constituição e desenvolvimento válido do processo.(fl.131)
A autora requereu a decretação de falência da empresa Arte Equipamentos Eletrônicos LTDA., com fundamento no art. 94, inciso II da Lei n. 11.101/2005, que dispõe:
Art. 94. Será decretada a falência do devedor que:
(...) II – executado por qualquer quantia líquida, não paga, não deposita e não nomeia à penhora bens suficientes dentro do prazo legal;
Nesse sentido, Waldo Fazzio Júnior sustenta:
"Nesse ponto, o que se leva em conta não é o inadimplemento de divida líquida e certa, mas o fato de, tendo ocorrido propositura de ação executiva, qualquer que seja, ou eficácia executiva imediata de alguma sentença, não ter o empresário executado pago, depositado a quantia reclamada ou nomeado bens à penhora.
(...)
Ajuizado pedido de falência, com arrimo no n. II do art. 94 da LRE, incumbe ao autor tão–somente comprovar que o devedor, citado para regular execução, não pagou nem depositou a quantia reclamada e tampouco nomeou bens à penhora. (FAZZIO JÚNIOR, Waldo. Nova lei de falência e recuperação de empresas. São Paulo: Atlas, 2005. p. 213) (grifos nossos)
Assim, para que se decrete a falência da empresa, faz-se necessário que, embora devidamente citada na pessoa do representante legal no processo de execução, não tenha pago, depositado ou indicado bens em valor suficiente ao adimplemento da obrigação executada.
O art. 12, VI, do CPC informa que cabe a representação judicial das pessoas jurídicas àqueles indicados nos estatutos e, em caso de omissão, aos diretores. Os artigos 1060 e 1061 do Código Civil, por sua vez, dispõem que nas sociedades por quotas de responsabilidade limitadas, tal como na espécie dos autos, a representação cabe ao administrador, ou a quem for delegada a administração na forma da lei e do contrato social.
Nas certidões de fls. 9 e 91, há indicação expressa de que o Sr. Sebastião Itapuan Costa é o Sócio-Gerente da empresa ré, e estaria habilitado a representá-la judicialmente.
Ainda que o Sr. Francisco José de Souza fosse empregado da empresa, o que sequer foi demonstrado pela autora, não há como cogitar da aplicação da teoria da aparência, uma vez que a citação foi realizada no endereço residencial do citado, local diverso da sede da ré.
Também não há notícia nos autos da existência de procuração que lhe conferisse poderes de representação ou permitisse receber citação em nome da empresa ré.
Conforme consignado pelo magistrado, a autora, a despeito de ter sido, por duas vezes, instada a comprovar a capacidade de representação do Sr. Francisco José de Souza, não o fez.
Diante da ausência da regular citação no processo de execução, falta o requisito essencial para o processamento do pedido de falência.
Nesta linha de entendimento acórdão do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul:
AGRAVO DE INSTRUMENTO. PEDIDO DE FALÊNCIA. ALEGAÇÃO DE NULIDADE DA CITAÇÃO. PESSOA ALHEIA AO QUADRO SOCIAL DA EMPRESA. ARTIGO 247 DO CPC. RECONHECIMENTO. PRECEDENTES. É nulo o ato citatório, em ação falimentar, se feito a quem não tem poderes de representação da pessoa jurídica. No processo falitário, só se admite a citação na pessoa do representante legal da pessoa jurídica. Recurso provido para decretar a nulidade da citação. AGRAVO PROVIDO. (Agravo de Instrumento Nº 70010088037, Sexta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Artur Arnildo Ludwig, Julgado em 16/02/2005)
Em manifestação, o Procurador de Justiça, Dr. Jair Meurer Ribeiro ressaltou:
De fato, pelo que se depreende do presente feito, não há qualquer possibilidade do recurso ser provido, e, mesmo que isso acontecesse, não existiria qualquer possibilidade do processo de execução ter sucesso, posto que a documentação trazida aos autos evidencia que a sociedade tem como representante legal Sebastião Itapuan Costa e não Francisco José da Silva. É isso o que demonstram tanto a certidão simplificada que instrui a petição inicial, quanto aquela outra juntada à fl.91, as quais, também, retratam não ter havido mudança de endereço da empresa.
Muito embora conste da certidão do oficial de justiça (fl.16) que Francisco José da Silva tenha sido citado como representante da empresa, a só aceitação da citação na execução não o transforma em representante legal da pessoa jurídica, como pretende o Apelante, pois o Código de Processo Civil, no seu artigo 12, VI, diz, claramente, que o representante legal será definido no estatuto ou, em caso de silêncio do estatuto nesse sentido, por seus diretores.
E Francisco José da Silva não foi designado representante legal pelo estatuto da sociedade, como demonstram as certidões de fls. 09 e 91. Além disso, não ficou comprovado documentalmente que ele tivesse poderes para gerir e representar a sociedade.
Um outro elemento que chama a atenção no presente processo é que, nas duas certidões simplificadas, expedidas em intervalo superior a quatro anos (a primeira data de 30/04/02, e a segunda, de 21/12/06), não consta que tenha havido qualquer modificação no registro da empresa, já que a última alteração retratada data de 1996.
E mais: o endereço da empresa, em ambas as certidões, é o mesmo. Todavia, não corresponde com o endereço constante das duplicatas e faturas constantes às fls. 10/11 e 13/14, respectivamente.
A prova produzida com a petição inicial não traz qualquer elemento que permita concluir pela existência da Requerida no momento da propositura da presente ação, como também não há nos autos qualquer elemento que permita localizar os sócios da empresa.
Também desperta a atenção, no presente caso, a lentidão com que se arrastou a execução distribuída em 28/01/2002 (fl.08), na qual a citação somente foi feita em 23/08/2003 (fl.16), ou seja, mais de um ano e meio depois. Então passaram-se mais quase três anos até que o presente pedido de falência fosse proposto. E essa lentidão não restou esclarecida nos autos, permitindo concluir pelo pouco desempenho da Requerente na defesa de seus interesses.
Assim, a chance da presente ação gerar algum resultado, no sentido de assegurar os direitos da Requerente, parece ser inexistente, de modo que não se justifica o seu prolongamento.
Quanto ao argumento constante das razões do apelo, de que a citação feita na pessoa de Francisco José da Costa foi válida, significando, então, sua capacidade para representar a empresa, não tem como prosperar, pois não é a citação que fixa a representação da pessoa jurídica, mas sim os seus atos constitutivos e suas alterações subseqüentes. É representante legal da sociedade quem o seu estatuto ou contrato assim determina, e não quem, no caso de ação judicial, é indicado pela parte adversa e que, inadvertidamente, aceita a citação sem poderes para tanto. (fl. 131/132)
No que concerne ao pedido de redução do valor arbitrado a título de honorários advocatícios, melhor sorte não tem a apelante.
Diferentemente do alegado, a sentença não arbitrou os honorários em valor superior a 10% sobre o valor da causa. Em verdade, a apelante, em flagrante ato de deslealdade processual, busca induzir o julgador em erro, pois o valor da causa é de 6.381,28 (seis mil trezentos e oitenta e um reais e vinte e oito centavos). Assim, mantenho o valor fixado de R$500,00 (quinhentos reais).
Ante o exposto, nego provimento ao apelo e mantenho íntegra a sentença.
A Senhora Desembargadora ANA MARIA DUARTE AMARANTE BRITO – Revisora
Conheço do recurso, presentes que se fazem os pressupostos de admissibilidade.
Cuida-se de apelação interposta contra sentença que, em pedido de falência, julgou extinto o processo sem julgamento do mérito, ante a ausência de pressuposto específico de constituição e desenvolvimento válido do processo.
Apela a requerente, sustentando que a citação efetuada na execução é válida, pois os documentos acostados aos autos não demonstram que Francisco José de Souza não tinha poderes para representar a requerida. Requer a cassação da sentença e o prosseguimento do feito ou, não sendo este o entendimento, a redução dos honorários advocatícios para 10% sobre o valor do título, nos termos do art. 20, § 4º do CPC.
Tenho que não assiste razão à apelante.
A apelante requereu a falência da apelada, com fulcro no art. 94, II da Lei nº 11.101/2005, o qual estabelece que será decretada a falência do devedor que, executado por qualquer quantia líquida, não paga, não deposita e não nomeia à penhora bens suficientes dentro do prazo legal.
Acontece que, consoante bem ponderou a MM. Juíza a quo, a pessoa indicada na inicial como representante legal da apelada não coincide com o representante legal da requerida indicado na certidão simplificada de fl. 09.
Com efeito, nos termos do art. 12, VI do CPC, as pessoas jurídicas serão representadas em juízo por quem os respectivos estatutos designarem.
No caso dos autos, é possível aferir das certidões acostadas às fls. 09 e 91, que o sócio gerente da sociedade era Sebastião Itapuan Costa, a quem incumbia representar a sociedade.
Portanto, não há nos autos qualquer documento que comprove que Francisco José de Souza era, à época da citação, representante da devedora, especialmente se considerar que o mandado de citação na execução foi cumprido em sua residência, ou seja, em lugar diverso da sede da ré.
Além disso, a simples aceitação da citação na execução não é suficiente para imputar-lhe a condição de representante legal apelada.
Outrossim, nem se poderia cogitar de alguma alteração contratual nesse ínterim, pois consoante se infere das certidões juntadas às fls. 09 e 91, a última alteração contratual da sociedade ocorreu em 1996, ou seja, em data bem anterior à propositura da execução.
Assim, diante da irregularidade na citação da apelada, não há como proceder ao regular processamento da falência, ante a ausência de pressuposto específico de constituição e desenvolvimento válido do processo.
No tocante, ao pedido de redução de honorários para 10% do valor do título, melhor sorte não assiste à apelante.
É que a apelante considerou o valor original de um dos títulos apenas, que era de R$ 2.760,00 (dois mil setecentos e sessenta reais). Na verdade, o valor da causa é de R$ 6.381,28 (seis mil, trezentos e oitenta e um reais e vinte e oito centavos), que é o valor atualizado do débito.
Nesse passo, como a MM. Juíza a quo fixou os honorários em R$ 500,00 (quinhentos reais), ou seja, aquém dos 10% (dez por cento) pretendidos pela apelante, tenho que não merece qualquer reparo.
Ante o exposto, nego provimento ao recurso.
É como voto.
O Senhor Desembargador JAIR SOARES – Vogal
Com a Relatora.
DECISÃO
Negou-se provimento. Decisão unânime.