Conforme precedente do Superior Tribunal de Justiça "aos delitos falimentares cometidos anteriormente à vigência da Lei n.º 11.101⁄05 aplica-se o rito previsto nos arts. 503 a 512 do Código de Processo Penal, por expressa disposição de seu art. 192 ("Esta Lei não se aplica aos processos de falência ou de concordata ajuizados anteriormente ao início de sua vigência, que serão concluídos nos termos do Decreto-Lei no 7.661, de 21 de junho de 1945") (HC 88.000⁄SP, Rel. Min. ARNALDO ESTEVES LIMA, QUINTA TURMA, julgado em 06.05.2008, DJe 23.06.2008"). Pelo regime jurídico da antiga lei de quebras, a prescrição da pretensão punitiva dos crimes falimentares ocorria após quatro anos entre a sentença que declara a falência e o recebimento da denúncia, sendo dois anos do artigo 132, §1º (previsão para encerramento normal do processo falimentar) somados aos dois anos do artigo 199, parágrafo único, todos do decreto-lei 7.661⁄45. Levando-se em consideração (i.) o não encerramento do processo falimentar em primeiro grau; (ii.) a data em que fora publicada a sentença que declarou a falência e (iii.) o não recebimento válido da denúncia que pudesse vir a interromper o prazo prescricional, é de se concluir pela impossibilidade de recebimento da denúncia neste momento, posto já alcançada pela prescrição a pretensão punitiva do Estado. A aplicação do permissivo advindo do §1º do artigo 132 do decreto-lei 7.661⁄45, que permite a força maior como causa justificante da demora no encerramento do processo de falência exige a iniciativa probatória por parte do Ministério Público, que instado a se manifestar com relação à preliminar de prescrição suscitada pelos denunciados limitou-se a pugnar pelo prosseguimento da ação, sem produzir prova que conduzisse a entendimento diverso com relação ao tema".
Leia, abaixo, a íntegra deste v. acórdão!
Acórdão: Ação Penal n. 100070017478.
Relator: Des. Carlos Henrique Rios do Amaral.
Data da decisão: 13.11.2008.
Classe: Ação Penal
Órgão: TRIBUNAL PLENO
Data de Julgamento: 13/11/2008
Data da Publicação no Diário: 25/11/2008
Relator : CARLOS HENRIQUE RIOS DO AMARAL
Origem: TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESPÍRITO SANTO
EMENTA: PENAL E PROCESSUAL PENAL - CRIME FALIMENTAR – DIREITO INTERTEMPORAL - PRESCRIÇÃO - ENUNCIADO Nº 147 DA SÚMULA DO STF - RECEBIMENTO VÁLIDO DA DENÚNCIA - PRECEDENTES - PRELIMINAR ACOLHIDA - DENÚNCIA REJEITADA. 1. Conforme precedente do Superior Tribunal de Justiça aos delitos falimentares cometidos anteriormente à vigência da Lei n.º 11.101⁄05 aplica-se o rito previsto nos arts. 503 a 512 do Código de Processo Penal, por expressa disposição de seu art. 192 ("Esta Lei não se aplica aos processos de falência ou de concordata ajuizados anteriormente ao início de sua vigência, que serão concluídos nos termos do Decreto-Lei no 7.661, de 21 de junho de 1945") (HC 88.000⁄SP, Rel. Min. ARNALDO ESTEVES LIMA, QUINTA TURMA, julgado em 06.05.2008, DJe 23.06.2008). 2. Pelo regime jurídico da antiga lei de quebras, a prescrição da pretensão punitiva dos crimes falimentares ocorria após quatro anos entre a sentença que declara a falência e o recebimento da denúncia, sendo dois anos do artigo 132, §1º (previsão para encerramento normal do processo falimentar) somados aos dois anos do artigo 199, parágrafo único, todos do decreto-lei 7.661⁄45.3. Levando-se em consideração (I.) o não encerramento do processo falimentar em primeiro grau; (II.) a data em que fora publicada a sentença que declarou a falência e (III.) o não recebimento válido da denúncia que pudesse vir a interromper o prazo prescricional, é de se concluir pela impossibilidade de recebimento da denúncia neste momento, posto já alcançada pela prescrição a pretensão punitiva do Estado. 4. A aplicação do permissivo advindo do §1º do artigo 132 do decreto-lei 7.661⁄45, que permite a força maior como causa justificante da demora no encerramento do processo de falência exige a iniciativa probatória por parte do Ministério Público, que instado a se manifestar com relação à preliminar de prescrição suscitada pelos denunciados limitou-se a pugnar pelo prosseguimento da ação, sem produzir prova que conduzisse a entendimento diverso com relação ao tema.
RELATÓRIO
Cuida-se de denúncia ofertada pelo MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO ESPÍRITO SANTO em face de LUIZ CARLOS MOREIRA, GERALDO ALVES SICUPIRA e WANTUIL CORREA NETO, em virtude de suposta prática dos crimes previstos no artigo 186, inciso VI e VII, artigo 188, incisos III e VIII e artigo 189, inciso I, todos do decreto-lei 7.661/45.
Sustentou o parquet, em síntese sumária, que pelas peças produzidas no curso da ação de falência nº 024.020.037.178 da empresa GEMAS COMÉRCIO E INDÚSTRIA LTDA, teria sido comprovada a prática de crimes falimentares pelos denunciados, com o fito de tirarem vantagem econômica do patrimônio da massa falida e, consequentemente, direitos de eventuais credores.
Para tanto, argumentou que os autos da ação falimentar dariam conta da inexistência de bens a serem arrecadados, bem como dos livros obrigatórios e necessários à administração da massa falida, além da falta de apresentação do balanço regularmente lançado no livro diário.
Aduziu, ainda, que constaria dos autos as certidões dos oficiais de justiça dando conta da impossibilidade de lacrar-se o estabelecimento, fixação de sentença, bem como intimação dos representantes legais da massa falida, ora denunciados, em virtude da empresa não funcionar mais no local indicado e os seus denunciados estarem desaparecidos, presumindo-se assim que os mesmos não possuiriam intenção de arcar com as suas responsabilidades perante credores.
Argumentou ainda que o denunciado LUIZ CARLOS MOREIRA, apesar de não se encontrar no quadro societário da falida, teria participado na produção do Contrato de Parcelamento de Débito que gerou o título de crédito que deu ensejo ao decreto de falência da empresa.
Diante destes fatos, requereu o recebimento da denúncia e a instauração da devida ação penal pública, para fins de condenação dos denunciados como incursos nas sanções previstas nos artigos 186, inciso VI e VII, 188, incisos III e VIII e 189, inciso I, todos do decreto-lei 7.661/45.
Decisão do juízo falimentar recebendo a denúncia e encaminhando os autos à distribuição junto a uma das Varas Criminais da comarca da capital às fls. 07.
Documentos anexados a pedido do Ministério Público e por ordem do juiz da Vara de Falência da capital às fls. 10/60.
Distribuição dos autos ao Juízo da 8ª Vara Criminal da comarca da capital às fls. 62.
Despacho determinando a citação dos denunciados às fls. 64.
Petição do denunciado LUIZ CARLOS MOREIRA juntando aos autos documentação que comprova o exercício de mandato de Deputado Estadual junto à Assembléia Legislativa do Estado do Espírito Santo, às fls. 78/80.
Às fls. 81 decisão do juízo da 8ª Vara Criminal declarando sua incompetência em virtude da presença nos autos, como denunciado, de um Deputado Estadual.
Processo remetido ao Tribunal de Justiça e recebido em gabinete após distribuição em 04 de setembro de 2007.
Despacho encaminhando os autos à Procuradoria de Justiça às fls. 83.
Parecer da Procuradoria de Justiça opinando pela manutenção da competência do Tribunal de Justiça e ratificando os termos da denúncia oferecida pelo promotor em primeiro grau às fls. 86/88.
Denunciados notificados nos termos do artigo 298, §1º do Regimento Interno do Tribunal de Justiça e Lei 8.038/90.
Em virtude da notificação, os denunciados ofertaram resposta preliminar (fls. 102/110 e 124/131), através da qual, em síntese sumária, defenderam preliminar de extinção da punibilidade em virtude da prescrição e, no mérito, cerceamento de defesa.
Ao final, requereram o não recebimento da denúncia ou, caso superada a preliminar, a anulação da mesma em virtude do propalado cerceamento de defesa.
Autos remetidos à Procuradoria de Justiça às fls. 138/139, tendo a mesma opinado pelo recebimento da denúncia, prosseguindo-se na persecução criminal.
É este, em síntese sumária, o breve relatório.
Peço dia para julgamento.
Vitória (ES), 05 de setembro de 2008.
VOTO
Ilustres pares, conforme deixei exposto em sede de relatório, cuidam os autos de denúncia ofertada pelo MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO ESPÍRITO SANTO em face de LUIZ CARLOS MOREIRA, GERALDO ALVES SICUPIRA e WANTUIL CORREA NETO em virtude de suposta prática dos crimes previsto no artigo 186, inciso VI e VII, artigo 188, incisos III e VIII e artigo 189, inciso I, todos do decreto-lei 7.661/45.
Julgarei, a princípio, a preliminar de prescrição suscitada pelos denunciados para, em seguida, e se for o caso, adentrar ao julgamento de mérito.
Antes, contudo, deve ficar devidamente registrada e justificada a competência originária desta Corte para apreciação da causa haja vista a presença, no pólo passivo da demanda, do denunciado LUIZ CARLOS MOREIRA que, segundo o documento de fl. 80, exerce o mandato de Deputado Estadual na Assembléia Legislativa do Estado do Espírito Santo e, por isso, segundo o artigo 109, inciso I, alínea "a" da Constituição do Estado do Espírito Santo1, goza da prerrogativa de foro.
Fixada a competência desta Corte em razão da presença do agente político retro-mencionado, adentro ao julgamento propriamente dito.
Preliminar PELOS DENUNCIADOS
extinção da punibilidade em virtude da prescrição
Os denunciados alegaram, em sede preliminar, a ocorrência da extinção da punibilidade em virtude da ocorrência da prescrição.
Assiste razão aos denunciados.
Primeiramente tenho a esclarecer que ao caso em tela, aplica-se a antiga lei de falência - Decreto-lei 7.661/45 - por força do artigo 5º, inciso XL, da Constituição Federal2, bem como do artigo 192 da nova Lei de Falências3 - Lei 11.101/2005.
Posicionamento parecido com este, reconhecendo a aplicação das leis anteriores à Lei 11.101/2005, foi adotado pelo SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA, em acórdão que, no que interessa, ficou assim ementado:
PENAL E PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS. CRIME FALIMENTAR. NEGATIVA DE AUTORIA. REEXAME E VALORAÇÃO DE PROVAS. INVIABILIDADE NA VIA ELEITA. DELITO COMETIDO ANTERIORMENTE À EDIÇÃO DA LEI N.º 11.101/05. RITO ORDINÁRIO. [...]. 1. [...] 2. Aos delitos falimentares cometidos anteriormente à vigência da Lei n.º 11.101/05 aplica-se o rito previsto nos arts. 503 a 512 do Código de Processo Penal, por expressa disposição de seu art. 192 ("Esta Lei não se aplica aos processos de falência ou de concordata ajuizados anteriormente ao início de sua vigência, que serão concluídos nos termos do Decreto-Lei no 7.661, de 21 de junho de 1945"). [...] (HC 88.000/SP, Rel. Min. ARNALDO ESTEVES LIMA, QUINTA TURMA, julgado em 06.05.2008, DJe 23.06.2008)
Firme nestas razões, adentro ao julgamento da preliminar.
O decreto-lei nº 7.661/45, em seu artigo 199, assim se manifestava:
Art. 199 - A prescrição extintiva da punibilidade de crime falimentar opera-se em dois anos. Parágrafo único. O prazo prescricional começa a correr da data em que transitar em julgado a sentença que encerrar a falência ou que julgar cumprida a concordata.
Muito se debateu com relação a este artigo e, com a finalidade de sedimentar a questão, o SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL lançou enunciado que cuida da matéria e que assim se pronuncia:
Enunciado nº 147 - "A PRESCRIÇÃO DE CRIME FALIMENTAR COMEÇA A CORRER DA DATA EM QUE DEVERIA ESTAR ENCERRADA A FALÊNCIA, OU DO TRÂNSITO EM JULGADO DA SENTENÇA QUE A ENCERRAR OU QUE JULGAR CUMPRIDA A CONCORDATA". (Sessão Plenária de 13.12.1963; Fonte de Publicação: Súmula da Jurisprudência Predominante do Supremo Tribunal Federal - Anexo ao Regimento Interno, Edição: Imprensa Nacional, 1964, p. 83)
E para a interpretação do enunciado supra transcrito, no que este se refere à data em que deveria estar encerrado o processo falimentar, deve se levar em consideração o artigo 132, §1º, da antiga Lei de Falências, que dizia que "salvo caso de força maior, devidamente provado, o processo da falência deverá estar encerrado dois anos depois do dia da declaração".
Sendo assim, encerrado o processo falimentar em dois anos, contava-se a prescrição a partir do trânsito em julgado da sentença de encerramento da falência.
Todavia, desenrolando-se o processo falimentar por período superior a dois anos, tem-se início o prazo prescricional contando-se este a partir da publicação da sentença declaratória de falência.
Conclui-se, desta forma, que pelo regime jurídico da antiga lei de quebras, a prescrição da pretensão punitiva dos crimes falimentares ocorria após quatro anos entre a sentença que declara a falência e o recebimento da denúncia4, sendo dois anos do artigo 132, §1º (previsão para encerramento normal do processo falimentar) somados aos dois anos do artigo 199, parágrafo único, todos do decreto-lei 7.661/45.
Neste sentido, trago à tona lição de RUBENS REQUIÃO:
"Assim, se houver sentença de encerramento antes de dois anos da declaração da falência, o prazo prescricional do crime falimentar inicia-se da data em que aquela sentença passou em julgado; se decorrido o prazo de dois anos, sem que haja sentença de encerramento da falência, a prescrição criminal tem seu início a contar do dia em que aquela sentença deveria ter sido proferida, isto é, dois anos após a sentença declaratória de falência".5
Em consonância com a doutrina, demonstro extratos jurisprudenciais que corroboram e dão certeza da posição que assumo:
RECURSO ESPECIAL. PROCESSO PENAL. CRIMES FALIMENTARES. "A contagem de prazo para prescrição em crimes falimentares ocorre dois anos após a decretação da falência, somados a mais dois anos após o trânsito da sentença que decretou a falência, perfazendo-se um total de quatro anos." Recurso conhecido e provido. (REsp 445.068/SP, Rel. Ministro JOSÉ ARNALDO DA FONSECA, QUINTA TURMA, julgado em 11.11.2003, DJ 09.12.2003 p. 311)
CRIMINAL. RECURSO ESPECIAL. FALSIDADE IDEOLÓGICA. CRIME CONTRA A ORDEM TRIBUTÁRIA. PRESCRIÇÃO RETROATIVA. RECONHECIMENTO EM RELAÇÃO A AMBOS OS RECORRENTES. CRIME FALIMENTAR. EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE RECONHECIDA SOMENTE EM RELAÇÃO A UM DOS RECORRENTES. NÃO CONHECIMENTO DO RECURSO NOS DEMAIS ASPECTOS. [...] II. A prescrição, nos delitos falimentares, ocorre em 02 anos, sendo que o prazo prescricional começa a correr da data do trânsito em julgado da sentença que encerrar a quebra ou de quando deveria estar encerrada a falência, devendo ser considerados, também, os marcos interruptivos previstos em lei. Entendimento das Súmulas 147 e 592 do STF. [...] (REsp 778.530/RJ, Rel. Ministro GILSON DIPP, QUINTA TURMA, julgado em 07.03.2006, DJ 27.03.2006 p. 325)
No caso vertente, conforme deixei exposto em sede de relatório, a denúncia foi oferecida em primeiro grau, tendo o MM. Juiz da Vara Especializada em Falência da capital a recebido no dia 21 de novembro de 2006 e encaminhado os autos para a 8ª Vara Criminal do juízo de Vitória.
Contudo, como alhures relatado, há no pólo passivo da demanda um Deputado Estadual, o que motivou, em 08 de agosto de 2007, a declaração de incompetência do juízo de primeiro grau e a remessa dos autos para este Egrégio Tribunal de Justiça.
Chegando aqui, em conformidade com o Regimento Interno do Tribunal de Justiça (artigo 294 e seguintes), fora determinada - após a ratificação dos atos realizados em primeiro grau pelo Procurador de Justiça - a oitiva preliminar dos denunciados e manifestação da Procuradoria com relação à mesma, tendo os autos sido encaminhados à conclusão em 15 de maio de 2008.
Assim, levando-se em consideração (i.) o não encerramento do processo falimentar em primeiro grau; (ii.) a data de 20 de novembro de 2002, em que fora publicada a sentença que declarou a falência (fls. 44) e (iii.) o não recebimento válido da denúncia que pudesse vir a interromper o prazo prescricional, é de se concluir pela impossibilidade de recebimento da denúncia neste momento, posto já alcançada pela prescrição a pretensão punitiva do Estado.
Frise-se que a aplicação do permissivo advindo do §1º do artigo 132 do decreto-lei 7.661/45, que permite a força maior como causa justificante da demora no encerramento do processo de falência, a meu sentir, por expressa determinação legal, exige a iniciativa probatória por parte do Ministério Público, que instado a se manifestar com relação à preliminar de prescrição suscitada pelos denunciados limitou-se a pugnar pelo prosseguimento da ação, sem produzir prova que conduzisse a entendimento diverso com relação ao tema.
Ante o exposto, na forma §3º do artigo 298 do Regimento Interno do Tribunal de Justiça, reconheço a extinção da pretensão punitiva e, de conseqüência, REJEITO a denúncia oferecida em desfavor dos denunciados.
É como voto.
Conclusão
À UNANIMIDADE DE VOTOS, REJEITAR A DENÚNCIA, NOS TERMOS DO VOTO DO RELATOR.