Íntegra do acórdão:
EMENTA: MANDADO DE SEGURANÇA - DIREITO LÍQUIDO E CERTO - LICITAÇÃO - EXIGÊNCIA DE HOMOLOGAÇÃO DO PLANO DE RECUPERAÇÃO JUDICIAL - AUSÊNCIA DE PREVISÃO LEGAL - FOMENTO À RECUPERÇÃO JUDICIAL - SENTENÇA MANTIDA
- o Mandado de Segurança, seja ele na forma repressiva ou preventiva, é cabível para a proteção de direito líquido e certo, não protegido por habeas corpus nem por habeas data, em sendo o responsável pelo abuso de poder ou ilegalidade autoridade pública, ou agente de pessoa jurídica, no exercício de atribuições do Poder Público, nos termos do art. 5º, LXIX da CF/88.
- A exigência de homologação do plano de recuperação judicial da empresa para participar de licitação é norma restritiva, sem previsão legal, que acaba por dificultar a contratação de empresa em recuperação judicial pelo Poder Público, o que vai de encontro aos próprios fins almejados pela Lei 11.101/05, que regula a recuperação judicial.
REMESSA NECESSÁRIA-CV Nº 1.0000.21.046349-3/001 - COMARCA DE BELO HORIZONTE - REMETENTE: JUIZ DE DIREITO DE 2ª FAZ. MUNICIPAL DE BELO HORIZONTE - AUTOR(ES)(A)S: VIA ENGENHARIA S. A. - RÉ(U)(S): MUNICÍPIO DE BELO HORIZONTE
A C Ó R D Ã O
Vistos etc., acorda, em Turma, a 4ª CÂMARA CÍVEL do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, na conformidade da ata dos julgamentos, em REEXAME NECESSÁRIO CONFIRMAR A SENTENÇA.
DES. DÁRCIO LOPARDI MENDES
RELATOR.
DES. DÁRCIO LOPARDI MENDES (RELATOR)
V O T O
Trata-se de Reexame Necessário da sentença de ordem 55 proferida pelo MM. Juiz de Direito da 2ª Vara de Feitos da Fazenda Pública Municipal da Comarca de Belo Horizonte que, nos autos do Mandado de Segurança impetrado por Via Engenharia S/A em face do Secretário Municipal de Obras e Infraestrutura de Belo Horizonte e do Presidente da Comissão Permanente de Licitações da Secretaria Municipal de Obras e Infraestrutura, concedeu a segurança para confirmar a liminar concedida e declarar nulo o item 8.2.3 do aviso de licitação RDC nº 30/2019, bem como para autorizar que a impetrante participe do processo licitatório, independentemente da apresentação do plano de recuperação judicial homologado.
Não foi interposto recurso voluntário.
Parecer da douta Procuradoria-Geral de Justiça, a ordem 62, opinando pela confirmação da sentença em reexame necessário.
Conheço do reexame necessário, nos termos do art. 14, § 1º da Lei 12.016/2009.
Como cediço, o Mandado de Segurança, seja ele na forma repressiva ou preventiva, é cabível para a proteção de direito líquido e certo, não protegido por habeas corpus nem por habeas data, em sendo o responsável pelo abuso de poder ou ilegalidade autoridade pública, ou agente de pessoa jurídica, no exercício de atribuições do Poder Público, nos termos do art. 5º, LXIX da CF/88.
Com o presente mandado de segurança pretende a impetrante que seja reconhecida a ilegalidade do item 8.2.3 do aviso de licitação RDC nº 30/2019, que enuncia que não será permitida a participação direta ou indireta na licitação de pessoa jurídica que estiver sob falência, dissolução, liquidação, ou com pedido de recuperação judicial ou extrajudicial pendente de concessão ou homologação pelo juízo competente.
Segundo consta dos autos, a empresa impetrante encontra-se em recuperação judicial com plano de recuperação ainda pendente de homologação pelo juízo competente, pelo que, pelos termos do edital, não poderia participar da licitação para execução de obras e serviços de fechamento do canal Ribeirão Arrudas e alargamento de pistas, nessa Capital.
Na sentença, o douto juiz a quo reconheceu a ilegalidade da exigência e concedeu a segurança.
Pois bem.
A meu juízo, a sentença deve ser mantida.
Isso porque, de fato, a exigência de homologação do plano de recuperação judicial da empresa para participar em licitação é norma restritiva, sem previsão legal, que acaba por dificultar a contratação de empresa em recuperação judicial pelo Poder Público, o que vai de encontro aos próprios fins almejados pela Lei 11.101/05, que regular a recuperação judicial.
Ora, empresas nessas condições precisam, mais do que qualquer outra, fomentar sua atividade econômica, sendo que restringir sua participação em licitação acaba por frustrar os próprios fins da recuperação judicial.
Não vislumbro, como alegado pela Administração Pública, que se trata de uma garantia de cumprimento dos contratos, tendo em vista que, em caso de suposto inadimplemento, há meios de se cobrar as empresas ganhadoras do certame, mesmo em recuperação judicial.
De ressaltar que no caso em apreço, o plano de recuperação judicial já foi processado, estando apenas pendente de homologação pelo juízo competente.
Nesse sentido, parecer da douta Procuradoria Geral de Justiça:
A concessão da ordem no mandado de segurança demanda a existência de direito líquido e certo em virtude de ilegalidade praticada por autoridade pública ou agente de pessoa jurídica no exercício de atribuições do Poder Público.
O art. 37 da Constituição Federal impõe que a Administração Pública deve observar o princípio da legalidade.
A licitação, por sua vez, destina-se a garantir a observância do princípio constitucional da isonomia, a seleção da proposta mais vantajosa para a administração e a promoção do desenvolvimento nacional sustentável, sendo vedado aos agentes públicos o estabelecimento de cláusulas que restrinjam seu caráter competitivo, conforme art. 3º da Lei nº 8.666/93.
Nessa ótica, a restrição de participação de empresa em recuperação judicial em procedimento licitatório deve ter respaldo legal, não se justificando restrições que dificultem a preservação da empresa.
O item 8.2.3 do Edital da Licitação SMOBI nº 030/2019 - doc. 04 - vedou a participação de empresas que estivessem com pedido de recuperação judicial pendente de homologação.
Ocorre que referida restrição não tem amparo legal e viola a finalidade da Lei nº 11.101/05, que visa a preservação da empresa, e da própria Lei nº 8.666/93, a qual busca a seleção da proposta mais vantajosa para a Administração Pública.
Assim, em face da ilegalidade da exigência editalícia, deve ser confirmada a sentença que concedeu a segurança".
Portanto, vislumbro presente o direito líquido e certo da impetrante de participar da licitação, caso preenchidos todos os outros requisitos exigidos.
Ante ao exposto, EM REEXAME NECESSÁRIO CONFIRMO A SENTENÇA.
DESA. ANA PAULA CAIXETA - De acordo com o(a) Relator(a).
DES. RENATO DRESCH - De acordo com o(a) Relator(a).
SÚMULA: "EM REEXAME NECESSÁRIO CONFIRMARAM A SENTENÇA"